Òsáàlá é um assunto muito
complexo dentro do culto. Todo òrísá fúnfún, ou seja, pertencentes à classe dos
òrísás presentes desde o início do mundo e que veste branco, são considerados
um Òsáàlá. Nesse caso, Ògbáàtálá, Òdúdúwà, Òràníyàn, Ájálá, Ísálé, Òsáàlúfón,
Òrúnmíllá, Òkò, Òlóòròkè, Èfèjó, Ákànjápríkú, áròwú, Òsáàguíyàn, dentre outros,
são Òsáàlás e cada um possui uma história dentro do culto e foram grandes reis,
fundadores de povoados e vilarejos.
Os mais conhecidos Òsáàlás
são Òdúdúwà o fundador de Ífé e Ògbáàtálá o fundador de Ágbéòkútá e governante
supremo dos povos Ígbò. A disputa entre esses dois òrísás pela criação do
mundo, pelo domínio da terra e pelo poder absoluto, foi o tema de várias lendas
africanas. Na África o nome Òsáàlá é diretamente ligado à Ògbáàtálá, aquele que
segundo os mais velhos foi incumbido pelo próprio Òlóòrún ou Òlóòdúmárè (o deus
supremo) de criar o mundo e a humanidade. Já aqui no Brasil, o nome Òsáàlá está
diretamente ligado à Òsáàlúfón, o senhor da cidade de Ífón.
Òsáàlúfón seria o grande rei,
filho de Ògbáàtálá e herdeiro da terra, sendo chamado de Òlú Áíyè (senhor da
terra). Assim como seu pai, carrega em suas mãos o Òpáàsòrò, cajado feito de
estanho, símbolo da Supremacia e da hierarquia.
Foi casado com Nànàn e
Íyèmònjá e seu culto é expandido até mesmo entre os dahometanos e os demais
povos africanos. Muitas são as suas lendas, relatando detalhes de sua vida
poligâmica, mas sempre deixando claro o quanto era bom, justo e sensato. Tinha
o poder supremo, sendo respeitado por todos os demais ímòlés. Munido de seu
cajado de estanho e vestes brancas como a nuvem, Òsáàlúfón representa a figura
de um ancião, sábio, senhor da integridade e digno de respeito.
Às vezes se mostra ranzinza e
enquizilado. Gosta de tudo em ordem, limpo e organizado. Sempre fazia visitas a
seus filhos e amigos, sendo mais agarrado à Òsáàguíyàn, que herdou a linhagem
dos òrísás fúnfún. Certo dia visitou Sàngò nas terras de òíyó e acabou por ser
vítima de uma armadilha feita por Áíyrá, líder do exército da cidade, sendo
confundido com um ladrão e largado na prisão por longos sete anos. Sàngò após
ter visto o erro que seu exército cometera com o grande Òsáàlá, mandou que
todos os habitantes de Òíyó se vestissem de branco, fossem aos rios mais
próximos e trouxessem águas cristalinas, banhando Òsáàlúfón e fazendo uma
grande festa, repleta de ègbò, acaçá e demais iguarias temperadas apenas com
azeite de oliva. Até hoje esse ritual é repetido e os barracões celebram “As
águas de Òsáàlá”, onde os adeptos se vestem de branco, rezam e levam água em
quartinhas, lavando os assentamentos e o quarto de Òsáàlá e depois fazem uma
grande festa em homenagem ao senhor de Ífón. Após o erro ser corrigido, devido
a sua debilidade nas pernas agravada pela prisão e maus tratos, Òsáàlúfón mal
andava. Áíyrá por sua vez, foi castigado por Sàngò, tendo que carregar
Òsáàlúfón até Ífón nas costas e passando a servi-lo, sendo seu cervo.
Nànàn foi à primeira esposa
de Òsáàlúfón. Ela era de Dahomey, cidade que fazia fronteira com Ífón. Com Nànàn,
Òsáàlá teve três filhos: Òmóòlú (Sakpatá), Òsúmárè (Ákólò Gbèsén) e Íròkò
(Lòkò), voduns dahometanos que passaram a ser cultuados pelos iorubas. Depois,
Òsáàlá se casou com Íyèmònjá, a grande filha de òlóòkún, tendo com ela
Òsáàguíyàn, Òsànýn, Òkò, Ájè Sálúgá, Òsún, Òíyá, Ógbà e os gêmeos Ígbèjí.
Alguns ìtàns revelam divergências entre as esposas de Òsáàlá, sempre disputando
o amor e a atenção do marido. Nànàn era a mais velha e Íyèmònjá a mais nova.
Certo dia Òsáàlúfón partiu para uma viagem que levaria sete dias. Íyèmònjá
convenceu Nànàn a tomar banho de lama para rejuvenescer e melhorar a aparência.
Enquanto Nànàn ficou sete dias no pântano, Íyèmònjá se banhava com água fresca,
se enfeitava e se perfumava, aguardando o retorno de Òsáàlá. Sete dias se
passaram e Òsáàlúfón voltou para o palácio, sendo recebido por Íyèmónjá,
trajada com uma linda veste branca, limpa e perfumada. Íyèmònjá indagou sobre o
estado mental de Nànàn, dizendo para Òsáàlúfón que a mesma estava ficando
caduca, pois ficou sete dias no pântano junto com cobras e sapos. Òsáàlá foi
averiguar e se deparou com Nànàn imunda, dentro do pântano, vestida com uma
roupa suja e coberta de lodo. No mesmo instante Òsáàlá repudiou Nànàn,
separando-se da íyágbá.
Outras lendas contam uma
eterna rivalidade entre Èsú e Òsáàlúfón. Èsú era o grande mensageiro de
Òrúnmíllá e para os òrísás receberem mensagens de Òlóòrún
dependiam de Èsú.
Todos rendiam homenagem ao grande poder de Èsú, porém Òsáàlúfón orgulhoso
recusava-se a reverenciar Èsú, até por que Èsú era o seu avesso, gostando de
tudo o que era Èwó para Òsáàlá (dendê, òtín, carvão, sal, fumo, preto, etc). Em
uma determinada ocasião, Òsáàlúfón e Èsú discutiam quem era o mais antigo no
mundo. Èsú afirmava ser ele o mais antigo e Òsáàlúfón negava, afirmando já
existir no Òrún antes de Èsú e a terra serem criados. O desentendimento entre
eles foi tão grande, que os dois òrísás foram convidados a lutarem entre si,
diante dos demais ímòlés, reunidos numa assembleia. Como o de costume, Èsú e
Òsáàlá consultaram Ìfá antes do confronto. Eles foram orientados a fazerem
determinadas oferendas. Èsú confiante que venceria o ancião, não quis perder
tempo fazendo oferendas e foi para a Praça de Ífé, local da luta. Òsáàlúfón fez
todas as oferendas prescritas e também se dirigiu ao local. Èsú contava com
seus talismãs e sua magia para derrotar Òsáàlá e Òsáàlúfón apoiado em seu
Òpáàsòrò estava confiando em sua sabedoria e em seu poder. Começa a batalha e Òsáàlá
pega Èsú e lhe dá uma palmada, fazendo com que caia no chão machucado. Èsú se
levanta e Òsáàlá torna a lhe bater, dessa vez em sua cabeça, transformando-o em
um anão. Èsú se sacudiu e voltou ao tamanho normal. Òsáàlá então pegou a cabeça
de Èsú e a sacudiu com força e violência, fazendo com que ela ficasse enorme,
maior que seu corpo. Èsú esfregou a cabeça com as mãos e recuperou o seu
tamanho natural. Foi então a vez de Èsú que, pegando uma cabacinha, abriu-a
repentinamente na direção de Òsáàlúfón, saindo de dentro uma fumaça branca,
descolorindo Òsáàlá. Òsáàlúfón se esfregou repetidamente para voltar a sua cor
normal, mas foi em vão, ele não conseguia retornar a sua cor natural. Òsáàlúfón
então desfez seu turbante enrolado sobre a cabeça e, daí, tirou o seu poder, um
talismã, tocando com ele em sua boca e chamando Èsú que como uma marionete,
ficou sobre o controle de Òsáàlá, fazendo tudo o que lhe era mandado. Todos
então reconheceram o poder de Òsáàlá, afirmando que ele era maior que Èsú e os
demais òrísás, que ele sim era o òrísá mais antigo e poderoso.
Òsáàlúfón tem como principal
símbolo seu cajado, o Òpáàsòrò. O Òpáàsòrò é a insígnia do poder e da
hierarquia. Seria ele o divisor de águas, representando o Áíyè (terra), o Òrún
fúnfún (espaço sagrado reservado para os inocentes, os sinceros e aqueles que
tenham pureza em suas intenções) e o Òrún Márè (espaço sagrado reservado para os
seres perfeitos e absolutos sobre o céu e a terra, onde fica Òlóòrún e os
demais òrísás). É o senhor da procriação, responsável pela continuação e
propagação da espécie, sendo o senhor do sêmen. Tem como principal oferenda o
Ígbí (caramujo) e o Ílé (pombo branco). Seus animais a serem sacrificados, ao
contrário dos demais ògbórós (òrísás masculinos) são fêmeas, simbolizando a
união entre os sexos e a procriação. É sincretizado como Nosso Senhor do Bom
Fim e seu principal ritual é as águas de Òsáàlá. Na Bahia, no dia do Senhor do
Bom Fim os adeptos vão até a igreja de mesmo nome, trajando branco e portando
jarros com águas e flores, lavando toda a escadaria da igreja e fazendo suas
oferendas. Usa fílá por representar o mistério e o respeito. Senhor da
sabedoria e da liturgia, sendo o òrísá mais respeitado dentro todo o culto,
reverenciado até mesmo pelos demais òrísás que, se manifestam quando são
entoados cânticos ou rezas para o grande Òsáàlá, o maior entre todos os òrísás.
É o ultimo Òrísá cultuado nos
dias de festa, encerrando o culto.
Suas qualidades são:
- Ògbáàtálá- é o mais velho dentre todos os Òsáàlás. Seu nome é a aglutinação das palavras Ògbá – rei, tý – de e álá – pano branco, ou seja, o rei do pano branco. É o guardião cívico, protetor dos templos e cidades. Representa as massas de ar, as águas frias e imóveis do começo do mundo. Disputa com Òdúdúwá o posto de criador da terra, sendo aquele que recebeu a devida missão. Pai de muitos òrísás fúnfún, dentre eles Òsáàlúfón. É o Òsáàlá mais conhecido dentre todo o território africano, sendo um dos grandes deuses iorubas;
·
Òdúdúwà- é
segundo as lendas o fundador de Ífé, o berço do mundo. Muitos são seus mitos e
em alguns vilarejos africanos é cultuado como Òdú ou Òdúwà, a senhora da cabaça,
aparecendo no aspecto feminino e tendo grandes vínculos com as Íyámí. No
território de Ádò, Òdúdúwà é indiscutivelmente íyágbá, sendo a esposa de
Ògbáàtálá e dividindo com ele o poder do mundo, representado pela cabaça, cuja
parte de cima é masculina e pertence à Ògbáàtálá e a parte de baixo é feminina
e pertence à Òdúdúwà. Já em Ífé e na
grande maioria do território africano, Òdúdúwà aparece no aspecto masculino,
sendo o pai de muitos òrísás, dentre os quais se destacam Ògún, Òdé, Èsú, Òkèrè,
etc;
·
Gbágbá Áfúrú-
demarcação qualificativa dos caminhos de Òsáàlúfón, onde nesta fase Òsáàlá é
completamente coligado ao elemento ar, representando o sopro divino (èmí), usado
por Òlóòdúmárè nos seres humanos com a finalidade de dar-lhes a vida. Senhor da
atmosfera e do oxigênio, tendo a propriedade de fazer com que o ar da terra
nunca acabe. Rege os pulmões e os demais órgãos ligados a respiração.
Representa o último suspiro, sendo responsável também pelo desencarne, estando
ligado tanto a vida quanto a morte;
·
Gbágbá Òfúríkàn- também chamado de Fúríkàn ou Òdídè, essa fase de Òsáàlúfón é
responsável pela aceitação e transporte de tudo o que é oferecido para os
Òrísás. Antes de se entregar ou levantar qualquer oferenda ou ègbó, bate-se
três vezes com a mesma no chão, dizendo-se “òdídè òdídè Ágò!”, desta forma
pedindo licença á Gbágbá Fúríkàn. Senhor do descanso e do repouso, responsável
por repor as energias, através do sono;
·
Gbágbá Òdè-
Fase de Òsáàlúfón ligada diretamente à velhice. É responsável pelo bem estar e
pela boa qualidade de vida dos idosos. Senhor da sabedoria dos anciãos, fazendo
com que sejam respeitados por suas experiências de vida. Tem a propriedade de
proteger os mais velhos, cobrando diretamente aqueles que maltratam e
desrespeitam os idosos. Rege o lado infantil da terceira idade;
·
Gbágbá Òlètúndè- fase de Òsáàlúfón ligada ao corpo e ao caráter. Rege a individualidade
do ser humano, frisando a tese de que ninguém nesse mundo é igual, todos são
diferentes. É o dono das impressões digitais e dos dedos das mãos. Senhor da
honestidade e da integridade, castigando os que vivem a margem da sociedade;
·
Gbágbá Èpá-
fase de Òsáàlúfón ligada diretamente ao Ògbí (noz de cola). Rege todos os
rituais onde esse fruto é consagrado e ofertado, respondendo diretamente por
todos òrísás no jogo de ògbí. Foi ele que ofertou o ògbí roxo para Èsú e Íyá
Tònàn. Sua principal quizila é o òkòtílé (broto do ògbí) e, por este motivo é
que os tiramos do Ògbí antes de ofertar à òrí, ígbá, ídí òrísá e oráculos;
·
Gbágbá Ápáàlá-
fase de Òsáàlúfón coligada diretamente aos caminhos de Sàngò e Áíyrá. Rege o
lado positivo de Áíyrá, tendo-o como seu principal e leal servo. Este Òsáàlúfón
representa o ítàn cujo Òsáàlá é carregado até seu castelo em Ífón por Áíyrá.
Possui como símbolo o ponto central do Òsè (machado de duas lâminas);
· Gbágbá Ájálá-
senhor do òrí, sendo chamado de gbágbá òrí. É o senhor de todas as cabeças,
responsável por modela-las e protege-las. Segundo os ìtàns, antes do ser humano
vir a terra, ele escolhe seu òrí na prateleira de Ájálá e logo depois recebe o
èmí (sopro da vida dado por Òlóòrún). Após receber o èmí ele vai até ònígbòdè
(o guardião do outro mundo) e se apresenta, relatando tudo o que vai fazer e
ser na terra, podendo depois nascer. Ájálá não é uma qualidade de Òsáàlúfón e
sim um òrísá a parte coligado a sua cultura por ser um Òsáàlá, ou seja, um
òrísá fúnfún. Não é iniciado em nenhum neófito, sendo cultuado no ígbá òrí
juntamente à Ìyá Másè;
· Gbágbá Ísálé-
òrísá fúnfún a parte, não sendo uma qualidade de Òsáàlúfón. Muito velho e
poderoso, Ísálé é o senhor da humanidade, responsável pela sua evolução e por
sua continuidade, evitando catástrofes e doenças que poderiam de uma vez só
erradicar a vida humana na terra. Recebeu diretamente de Òlóòrún a missão de
proteger os seres humanos e fazer com que caminhemos corretos para com as leis
divinas e os mandamentos do Deus Supremo;
· Gbágbá Lèjúgbè- Também chamado de òrísátèkó, vêm nos caminhos de Áíyrá, Íyèmònjá e Òdúdúwà.
É um Òrísá fúnfún a parte coligado a cultura de Òsáàlúfón por ser muito velho e
devagar. Tem como principais oferendas carnes brancas. É o grande Òsáàlá
cultuado na região de Sávé que fazia parte da comitiva de Òdúdúwà;
· Gbágbá Ájáguèmó- Òsáàlá cultuado em Èdé, tendo um culto a parte e sendo um antigo òrísá
fúnfún. Tem como maior símbolo o Águèmó (camaleão), animal de extrema
importância para os iorubas e presente desde o inicio do mundo. Conhecido por
anualmente promover um “combate de mímicas” disputado entre Gbágbá Ájáguèmó e
Òlúníwí;
· Gbágbá Álásé-
Òsáàlá cultuado em Ípòndá. Òrísá fúnfún responsável por abastecer o mundo
através das chuvas. É o grande salvador da humanidade, pois quando a terra
passava por um grande período de seca, foi Gbágbá Álásé que fez chover e salvou
os seres humanos. Cultuado como o senhor das nuvens;
· Gbágbá Òkò-
também chamado apenas de Òkò ou Òlágbírín, é um òrísá fúnfún presente desde o
principio da humanidade. Vêm nos caminhos de Ògún, Òsànýn, Òsóòsí e Òmóòlú. É o
grande senhor dos campos, da agricultura, das sementes e das favas. Segundo as
lendas, Òkò ganhou de Ògún ferramentas para poder arar a terra, facilitando o
plantio e o cultivo dos vegetais. Responsável por tudo o que a terra oferece
como refeição, tendo a propriedade de trazer o alimento à mesa de cada ser
humano. Usa cajado de madeira e uma flauta de osso. Também era um exímio
caçador, que transportava as riquezas do campo para a sua casa;
· Gbágbá Ákànjápríkú- Òrísá fúnfún originário das terras de Ífón. Seria um Òsáàlá muito
velho e arredio, cultuado inicialmente na casa do Òpò Áfónjá - BA. Está
presente desde o início do mundo e representa os antigos anciãos e a sabedoria
dos mais velhos. Tem fundamento com a ancestralidade, sendo cultuado aos pés do
Íròkò, árvore da qual se tira a madeira para a construção de seu cajado;
Saudação: Èsè ò èpá gbágbá! Ímòlé! Lésé Lésé!
Cor: branco;
Filiação: Ògbáàtálá;
Sincretismo: Senhor do Bom Fim;
Elemento: ar, terra e água;
Número: 10 (dez) e 16 (dezesseis);
Òdú: Òfún e Áláàfíá;
Dia da semana: sexta-feira;
Oferendas: acaçás, ègbò, frutas, doces, èmú, galinha d’angola
branca, cabras, frangas, pombos, ovelha, ìgbí, etc.
Ervas: Manjericão branco, colônia, folha da costa, malva branca, algodão,
boldo, barba de velho, alecrim, alfavaca, etc.
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