terça-feira, 21 de março de 2023

Frekwén

Frekwén
Dan Frekwén é a companheira de Dan Besén, seja como esposa ou irmã, ela é seu lado fêmea, a serpente que lhe acompanha. Muitos são os mitos que acompanham esse Vodun, mas sabe-se que Frekwén é muito perigosa e venenosa, sendo detentora de um gênio arredio. É tida como a serpente albina, de cor branca e amarela, sendo rara. É o arco-íris em torno do sol. Segundo os ítóns, Frekwén sempre ia ao rio beber água em forma de serpente. Toda vez que ela bebia, seu veneno vasava e matava os peixes. Os peixes foram reclamar com Òşún Ípòndá que ficou a espreita, esperando a serpente matar sua sede. Quando a serpente apareceu, Íyè Íyè Ípòndá sorrateiramente colocou sua adaga dourada em seu pescoço, fazendo força para matá-la. Foi quando Frekwén se revelou, e disse que não estava fazendo mal a ninguém, apenas queria saciar sua sede. Ípòndá benevolente permitiu que Frekwén continuasse a beber água em seu rio, porém lhe deu uma folha para que colocasse em sua boca e não soltasse veneno, mantendo os peixes vivos. Em troca, Frekwén ensinou a Ípòndá o segredo do arco-íris, dando-a domínio sobre as cores. Frekwén mora nas águas, enquanto Besén na terra. Certa vez os mahínos passaram por uma terrível estiagem, a terra ficou seca, o rio ficou seco, seus poços ficaram secos. Então eles se juntaram e foram até um grande poço vazio, levando tudo o que tinham de mais valor. Eles jogaram tudo dentro desse poço e pediram ao Deus criador que os ajudassem pois daquela forma morreriam. Foi quando do céu desceu uma grande serpente albina, de lindo brilho, cospindo muita água, mais tanta água que umideceu a terra, tanta água que encheu os poços, tanta água que se criou um rio, chamado mais tarde de rio Egbadô. Frekwén passou então a ser cultuada na margem desse rio, sendo lembrada como aquela que livrou o seu povo da seca e saudada como: Ahoboboy surú só (que significa saudamos aquela que se estica e nos dá água). Frekwén é amiga de Íyèwá e irmã gêmea de Tokwén. Em algumas casas acreditam que Íyèwá e Frekwén são a mesma divindade. Outras dizem que se uma filha de Íyèwá perder a virgindade, ela será iniciada de Frekwén. Frekwén da mesma forma que Íyèwá e Tokwén não é iniciada em homens, somente em mulheres. É filha de Akotokwén. Suas contas são o amarelo rajado de verde e vermelho ou todas as cores do arco-íris. Se veste de branco, como a maioria dos Voduns Dan. Usa o Draká (cetro real da família Dangbirá) e o Ozí (lança). Ahoboboy Dan Frekwén! 
Texto Mejitó Rômulo Dangballataví

terça-feira, 7 de março de 2023

Ájògún

*Ájògún*
Ájògúns (lê-se Ajôguns) são divindades presentes desde o início do mundo e foram criadas por Òlóòrún, o Deus supremo, juntamente com os Òríşás. Os Ájògúns faziam parte dos duzentos írúnmálés ou ímòlés que tinham a missão de povoar a terra e orientar os seres humanos. Após demonstrar todo o seu poder negativo, Òlóòrún expulsou os Ájògúns do òrún (céu) e os mandou para o áíyè (terra). O nome Ájògún significa "guerreiro", pois essas divindades travaram uma guerra contra a humanidade, se revoltando contra a maior criação de Deus. O mais poderoso Ájògún é Íkú, a morte, que apesar de ser inimiga dos seres humanos é essencial para a renovação do ciclo da vida. Íkú serve à Òlóòrún, porém muitas das vezes quer passar à frente da vontade do grande criador, interferindo diretamente no destino dos seres. Outro poderoso ájògún é Árún, a doença, que faz de tudo para tirar a saúde dos seres, sendo encarregado de ajudar Íkú. Ègbá (Êbá), a invalidez, trabalha junto com Árún, prendendo e imobilizando o corpo humano, deixando-o inválido e incapaz de viver naturalmente. Òfò (Ofô), a perda, trabalha para desafortunar os seres humanos, juntamente com Òsì (Ôsi), a pobreza. Èpè (Êpe), a maldição, é cultuado por aqueles que usam a magia para o mal, é a própria magia negra. Èsè (Êssê), a Tragédia, tem o poder de desestruturar a família e a sociedade, trabalhando com Íkú para levar vários espíritos ao mesmo tempo. Òràn (Orãn), o grande problema, traz agonia e desespero. Èjó (Êjó), a fofoca, contribui para a desunião das pessoas, afastando amigos e criando desconfortos. Èwòn (Êuóm), a prisão, trabalha para tirar a liberdade do ser humano. Todos os Ájògúns querem o mal da humanidade e se fortalecem com o sofrimento. Os sacerdotes que dominam a magia negra, chamados de Òşós (Ôxós), são conhecedores do culto aos Ájògúns e cultam essas divindades para atingir seus inimigos. Os Òríşás são os únicos que defendem e protegem a humanidade contra o ataque dos ájògúns, neutralizando o poder negativo, através de determinados èbós e sacrifícios. Òrúnmíllá (Ôrúmílá), é o grande Èlérípín (êléripím), testemunho da criação divina. Ele usa o Ífá e os Òdús para orientar os humanos como agir na terra, se livrando da interferência dos Ájògúns. Vale ressaltar que os Ájògúns são divindades e não espíritos, kiumbas, etc. Não possuem Èlègúns, ou seja, não incorporam. Os Ájògúns representam o mal para o povo iorubá, similar ao Diabo da cultura cristã. 
*Texto Mejitó Rômulo Dangballataví*

sexta-feira, 3 de março de 2023

Legba

*Vodun Legba*
Um dos Voduns mais importantes do culto djeji e um dos mais perigosos também, Legba tem seu culto derivado do culto à Èşú, porém com lendas diferentes que se encaixam ao panteão dos povos Fons.
É cultuado por toda extensão do antigo Dahomey, em todas as aldeias de culto Vodun. Ele é o grande guardião, aquele que avisa sobre as Ahuangas (guerras) e que garante a proteção e a vitória de seu povo. Normalmente seu òjúbó (assentamento) fica na entrada das aldeias, onde o sacerdote do culto a Legba faz oferendas e mantém um contato direto através de oráculos, para manter-se informado sobre qualquer evento futuro. Seria o filho caçula de Mawú-Lisá, o arteiro, aquele que precisa sempre estar sob os olhares dos pais pois a qualquer momento pode "aprontar". 
Por este motivo dizem que Legba foi morar com seus pais no Djí (alto), ora estando na lua com sua mãe, ora estando no sol com seu pai. 
Seu culto se espalhou pelas Américas, sendo cultuado no Candomblé, no Batuque, no Hoodoo e na Santeria. 
Teve 3 esposas Legbayonu, Awovi e Minona. 
No candomblé Brasileiro atribuíram Aiyzan como sua esposa e no Hoodoo ele é casado com Adjesi. 
Legba é o princípio físico, o poder do movimento e do dinamismo. É o ser que divide os seres, aquele que individualiza os indivíduos com a proposta de justificar que somos únicos e respondemos apenas por nossos atos. 
Seu símbolo na África é o falo (pênis), símbolo da procriação e poder masculino, enquanto que aqui nas Américas seu maior símbolo é a chave, pois seria Legba o único Vodun capaz de transitar entre os mundos, "abrindo" esta porta para as demais divindades passarem. 
Dentro do Fá (culto à adivinhação dos povos Fon), Legba é o mensageiro dos deuses, aquele que fala por todos, que traz e leva os recados, por este motivo cultuado por todos os Bokonons (sacerdotes do culto a Fá). 
Dentro do Hoodoo é chamado de Papa Legba, sendo visto como um ser velho, que anda apoiado com bengalas, isso devido ao seu sincretismo com São Lázaro, tendo suas festividades no dia 17 de Dezembro. 
No Candomblé do Sul é sincretizado como São Pedro, devido à chave e no Candomblé baiano e carioca é sincretizado como Santo Antônio ou o próprio Diabo. 
Legba é o primeiro Vodun à ser cultuado no Dolozan, tendo um ritual próprio chamado Legba Lí Lé. Neste ritual são entoadas cantigas de enaltecimento e súplicas, para que Legba permita o culto aos demais Voduns e traga proteção a casa. 
Assim como Èşú, seria o dono de tudo que a boca come, sendo ofertado com as mais variadas iguarias rituais. 
Sua cor é o vermelho e o preto, algumas vezes o roxo. Seus símbolos o tridente, o falo e a chave. Cultuado no Domingo (primeiro dia da semana) ou Segunda (primeiro dia útil da semana). 
Gosta de Gim, charuto e farofa de dendê. 
Dono de muitas riquezas, quem cultua Legba garante para sua casa a proteção e a prosperidade. 
Ahoboboiy Vodun Legba!
*Texto Mejitó Rômulo Dangballataví*

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Obí

*Òbí*
O culto aos Voduns, Òríşás e 'Nkisis certamente é rodeado de segredos e de objetos rituais, cada um com sua importância para a evocação da divindade e de seu áşé. Entre todos os objetos rituais, alguns se destacam por serem indispensáveis ao culto, possuindo uma importância litúrgica e nos aproximando mais do sagrado. O òbí sem dúvidas é um desses "objetos" que sem sua presença seria impossível o contato com as divindades. A Noz de cola ou òbí é oriundo da árvore Cola Acuminata, de origem da faixa equarorial africana. Desta noz são feitos xaropes, bebidas e refrigerantes. 
Dentro do culto Afro, o òbí está presente desde o èbó, a iniciação e até mesmo no Sihun (áşèşè), sendo um fruto sagrado, com poderes "mágicos" e com um simbolismo extremo. 
Um ítán conta que quando o caos estava generalizado no mundo antigo, onde Òríşás guerreavam entre si aqui na terra, Èlèdúnmárè ou Òlóòrún, o Deus supremo, teria convocado as 4 divindades primordiais para uma reunião, seriam elas Áíyè (a terra), Áláàfíà (a paz), Áísíkí (a prosperidade) e Gbá (a concórdia). Ali perante o Deus supremo, as 4 divindades entraram em oração pela terra, as divindades e os humanos que nela habitavam, para que se restaurasse a paz e o equilíbrio. Neste momento, Èlèdúnmárè teria feito um gesto com a mão direita como se tivesse apanhado algo no ar, repetindo novamente o mesmo gesto. Èlèdúnmárè tinha apanhado as preces das 4 divindades, dando para que Áíyè (a única divindade feminina que participava dessa reunião) plantasse. No dia seguinte no local onde foi plantado o áwò de Èlèdúnmárè nasceu uma árvore. Ela rapidamente cresceu, floresceu e deu frutos. Áíyè colheu os frutos e levou para o Deus supremo que pediu que ela levasse os frutos e preparasse de uma forma que lhe agradasse. Primeiro ela tostou os frutos, o que fez com que mudasse de textura e ficasse muito amargo. Depois ela cozinhou, os frutos mudaram de cor e não dava pra ser comido. As demais divindades primordiais tentaram de todas as formas preparar aquele fruto para ser consumido mas foi em vão. Foi então que Èlènínì, a divindade dos obstáculos se apresentou e disse que queria guardar os frutos. Ela lavou cuidadosamente a cápsula que guardava os frutos, limpou e lavou todas as nozes. Ela guardou por 14 dias, junto com as folhas frescas e depois comeu a noz crua e viu que dava para ser consumida. Ela guardou por mais 14 dias e comeu novamente, percebendo que ela se mantia fresca. Foi quando ela levou para Èlèdúnmárè as nozes e disse que elas poderiam ser consumidas cruas sem perigo. O Deus supremo então decretou que Èlènínì seria a divindade mais velha a conseguir resolver o mistério do produto das orações e, ordenou que dali por diante as nozes não deveriam mais ser somente alimento no céu mas também onde fosse apresentadas, deveriam ser oferecidas ao mais velhos do grupo e serem consumidas apenas em conjunto com orações. Ele também determinou que a árvore cresceria apenas nos locais onde os mais novos respeitassem os mais velhos. 
O primeiro òbí foi partido pelo próprio Èlèdúnmárè, ele tinha dois gomos e foi dividido entre o grande Deus e Èlènínì a divindade mais velha ali presente depois dele. O segundo òbí tinha 3 gomos, representando as 3 divindades masculinas que participaram do momento de prece. O terceiro tinha 4 gomos, representando Áíyè a única divindade feminina que participou do momento de prece. O quarto òbí tinha 5 gomos e foi conpartilhado com Òşáàlá e o último tinha 6 gomos representando a harmonia, resultado de todas as preces que foram emanadas, dividido então por todas as divindades ali presentes. 
Áíyè então levou a noz de cola para a terra, onde sua presença é marcada por preces e onde ela só germina em comunidades humanas onde existe o respeito pelos mais velhos. 
Existem dois tipos principais de òbí, o òbí ábátá, que se divide entre 3 a 6 gomos e o òbí gbànjá, que tem apenas 2 gomos. O òbí ábátá normalmente é usado para comunicação com as divindades, porém também pode ser usado em Eborís (Bòrí) e Nahunos (cortes). Já o òbí gbànjá é apenas usado em rituais como òbí òmí, Eborís ou Nahunos, não possuindo importância como oráculo. 
O òbí ábátá se divide em ífín, quando ele é totalmente branco, oferecido à Òşáàlá e demais Òríşás fúnfún e o púpá, quando ele é rosado, ofertado à qualquer outra divindade com exceção de Şángò que abomina o uso de òbí em seus ritos, sendo substituído pelo orobo.
O òbí gbànjá pode ser fúnfún, de coloração esbranquiçada, oferecido à todas divindades exceto Şángò, ou púpá, também chamado de òbí roxo, oferecido apenas à Èşú. 
Existe também o òbí ájóòpá, òbí mais doce, vermelho e bem maior. E o òbí ífín, ofertado a Òbáàtálá, perecido com o ájóòpá porém de coloração branca. 
O kòtílé é o caroço do òbí e deve ser arrancado do mesmo após o òbí ser partido. Essa é a forma pela qual "sacrificamos" o òbí, pelo local onde ele não germinará mais. 
Após ser partido e sacrificado, o òbí deve ser sempre jogado ao chão, no solo, isso se é explicado em um ítán que conta que quando òbí veio para a terra se tornou muito popular por conseguir entrar em contato com Òdús e os Òríşás. Ele era procurado por todos e logo se envaideceu, passando a cobrar caro por suas consultas. Tal soberba acabou por incomodar Èşú, o mensageiro, aquele que transita entre o céu e a terra, que foi até a casa de òbí tirar satisfação. Òbí escutou alguém batendo em sua porta e quando abriu se assustou ao ver Èşú, caindo de costas no chão. Neste momento Èlèdúnmárè fala do òrún que por causa da vaidade e orgulho de òbí ele nunca mais falaria em pé. Quando alguém procurasse seus serviços é no chão que ele deveria ser evocado, sendo seu castigo para todo o sempre. 
O òbí é saudado por òbí ò! (Saudamos o òbí/ salve o òbí) ou òbí írè! (Òbí de sorte). 
Ele jamais é sacrificado com òbé (faca), sendo aberto com os polegares e sacrificado com as mãos. Após o Áláàfíà, o òbí pode ser cortado com faca e distribuído entre os òjúbós e os mais velhos. 
O òbí também é usado em banhos, porém nunca fervido. Tira-se o kòtílé e rala-se o òbí para depois misturar com água, pós ou sumo de ervas. 
Quando usado em determinados èbós, ele é usado inteiro, não é partido nem sacrificado. 
*Texto Mejitó Rômulo Dangballataví*

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

Kojadá, Caledário Yorubá

*Dias da semana litúrgicos (kòjádá)*
No calendário Yorubá tradicional, são 4 dias da semana e cada um com um culto distinto para os Irunmolés.
-O primeiro dia é o òjò Òsè, dedicado à Òşáàlá e todos os Òríşás fúnfún. Agrada-se também Şápònà (Xapanan), Ègún e Íyámí;
-O segundo dia é o òjò áwò, dia de culto à Ífá, dedicado à Òrúnmíllá, Èşú e Òşún;
-O terceiro dia é o òjò Ògún, dia dedicado a cultuar o senhor do ferro Ògún e fazer seu òsé.
-O quarto dia é o òjò Jákútá, dia dedicado ao senhor do trovão Şángò e toda sua família.

Com a influência da igreja católica, houve a introdução dos 7 dias da semana também no culto Yorubá. Aqui no Brasil nós cultuamos da seguinte forma:

-Òjò Áíykú (Domingo)- Dia de cultuar Íbèjí e Ègbé òrún;
-Òjò Ájè (segunda-feira)- Dia de cultuar os ancestrais (Ègún, Íyámí, Aiyzan), Èşú e Azansú (Òmóòlú);
-Òjò Íşègún (terça-feira)- Dia de cultuar Ògún e Bessén;
-Òjò Òjòrú (quarta-feira)- Dia de cultuar Sogbo, Şángò, Áíyrá, Òíyá e Óbà;
-Òjò Òjòbò (Quinta-feira)- Dia de cultuar Òdé, Agué, Lògún-Èdé e Òsàníyn;
-Òjò Ètí (Sexta-feira)- Dia de cultuar Òşáàlá, Mawú e Lisá;
-Òjò Ábámètá (Sábado)- dia de cultuar Nànàn, Òşún, Íyèmònjá e Íyèwá;

Lembrando que esse calendário muda conforme território, ensinamento ou nação do candomblé. Foi criado com o intuito de melhor dividir os afazeres, sacrifícios e òsés para essas divindades. Aqui no Brasil é popular todo iniciado ou adepto da religião às sextas usar o branco, símbolo da paz e do grande Òríşá fúnfún.

*Texto Mejitó Rômulo Dangballataví*

sábado, 18 de fevereiro de 2023

A Quaresma e o Candomblé

*A quaresma e o Candomblé*
A quaresma é designada por um período de 40 dias que antecedem a Páscoa, onde comemora-se para os cristãos a ressurreição de Jesus. Nesse período católicos e cristãos do mundo inteiro se abstém de prazeres carnais e determinados alimentos, buscando purificar-se de seus pecados e ao mesmo tempo, homenagear os 40 dias de sofrimento de seu messias no deserto e seu martírio na cruz. O Candomblé é uma religião brasileira, de origem africana, porém com grande influência do catolicismo, uma vez que negros foram trazidos da África na condição de escravos e foram forçados a deixar de cultuar suas divindades para serem catequizados pela igreja. Apesar de todo o sofrimento de nossos ancestrais, eles não abriram mão de seu panteão, apenas tentaram assimilar as duas doutrinas, surgindo então o sincretismo religioso. Com tudo isso, muito do que se tem no candomblé, desde datas específicas para cultuar determinadas divindades até mesmo alguns rituais, possuem influência da doutrina católica e das festividades de seus santos. Por exemplo, Ògún que no Rio de Janeiro é sincretizado como São Jorge, acaba por ter suas festividades e oferendas em sua maioria em Abril, mês no qual São Jorge é reverenciado. A quaresma dentro do candomblé tradicional, era tida como uma época de dificuldades, pesada, onde os Òríşás iam guerrear contra a maldade do mundo e se recolhiam para o Òrún (espaço sagrado), só retornando no Sábado de aleluia, dia anterior a Páscoa. Antes do carnaval, se fazia o ritual do Òlóòrògún, onde os Òríşás eram chamados para o áşé para prepararem seus filhos para a quaresma. No Òlóòrògún ou Lorogun, os Òríşás vinham de branco, com átòrís (varas) em suas mãos e se golpeavam, lembrando a passagem do Òríşá Òşógíyón na terra, onde ele teve que fazer este ritual para salvar seu reino da fome, da miséria, da seca e da infertilidade (Esse ritual hoje em dia é feito na festa do Pilão de Òşógíyón). Após o ritual, os atabaques eram recolhidos e cobertos, os òjúbós (assentamentos) eram cobertos com panos brancos e a casa parava suas funções. Durante esse período, seus filhos seguiam o mesmo procedimento cristão, se abstendo de carnes, sexo e bebidas e mantendo uma espécie de resguardo, pois se acreditava que com a ausência dos Òríşás, eles estavam desprotegidos e a terra estava tomada de ègúns, esperando só uma oportunidade de fazerem o mal ou até obscediar um èlègún (médium). Na semana santa, os filhos de santo se resguardavam em suas casas de áşé, devidamente trajados de branco e de íkàns (contra-ègúns). Na sexta-feira santa, eram feitas incisões em seus corpos (curas) onde acreditava-se lembrar a morte e o sofrimento de Jesus (sincretizado como Òşáàlá), e ao mesmo tempo introduzindo determinados átíns (pós sagrados) que purificavam o corpo, para que o Òríşá ao retornar da guerra, "possuísse" um corpo limpo e devidamente preparado. Depois ceiavam e rezavam para Òşáàlá, pedindo misericórdia e paz para o mundo. No sábado de Aleluia acontecia um grande şírè, onde os Òríşás eram chamados ao som do Adahun para retornarem da guerra. Então era feito um grande èbó coletivo, onde cada Òríşá, munidos de ervas e comidas, limpavam a casa e todos os presentes. Só depois então era aberto o calendário litúrgico de festividades daquela casa de áşé, onde cada divindade ia ter suas devidas oferendas e festividades em suas datas correspondentes. 
*Texto de Mejitó Rômulo Dangballataví*

domingo, 16 de novembro de 2014

Nànàn é o mais velho ancestre feminino que se tem conhecimento. Para os povos Fóns, seu poder assemelha-se ao do grande Deus criador do universo, sendo ela filha de Mawú e Lisá (a lua e o sol respectivamente). Sua origem é dahometana onde ela é a mãe de quase todos os voduns. Já na cultura ioruba, Nànàn teria sido a esposa de Òsáàlá e mãe de três òrísás cuja origem também é dahometana: Òmóòlú (Sakpata), Íròkò (Loko) e Òsúmárè (Dan gbesen). Muitos são os ítóns que rodeiam sua passagem terrena, mas tanto em Dahomey quanto em kètú sua importância e poder são sempre destacados. Nànàn é a deusa das chuvas, da lama, do barro. Foi ela que cedeu o barro para que Ògbátáàlá moldasse os seres humanos mas, após o desencarne os corpos voltariam para o seu domínio, ou seja, seriam enterrados. É a senhora da morte e da ressurreição. Mãe da transformação, tendo domínio sobre o culto à Ègúngún e Íyámí Òsòròngá. Seu nome sempre impõe respeito, passando a ser uma divindade temida pelos mais antigos, devido a sua relação com Íkú. Nànàn é a deusa da sabedoria e da ancestralidade; possui certa "quizila" com metal, uns dizem que tal aversão é tida pelo fato de seu culto anteceder o uso do metal, outros dizem, que essa quizila foi após uma guerra com Ògún, o deus do ferro e dos metais, e a partir desse combate, para se mostrar superior e independente de qualquer utensílio coligado ao domínio de Ògún, Nànàn teria abandonado o uso do metal. Para os povos Fón, Nànàn ou Nànà seria um título dado a homens e mulheres sacerdotes da grande deusa lua (Mawú), nascendo devido este fato, uma infinita variação (qualidades) de Nànàn, tanto do sexo masculino quanto feminino.
Nànàn é um Òrísá/Vodun extremamente feminista, não sendo iniciada em neófitos homens e, em alguma casa, não sendo nem feita pelas mãos de homens. Juntamente com Íyóbà, fundou uma das sociedades mais conhecidas, voltadas para o culto aos ancestres femininos e tendo como principal divindade às Íyámí Òsòròngá.
Pelo fato de ser a senhora que possui o domínio sobre a morte, Nànàn é coligada à todos os ancestrais, inclusive a Ègúngún. Devido a todos os mistérios e mitos que envolvem a cultura dessa divindade, muitas pessoas temem Nànàn e evitam inicia-las, acreditando estar iniciando a própria morte.
Para iniciar uma filha de Nànàn, é necessário muito conhecimento, uma vez que meche com toda a estrutura do ásé. Os filhos devem ficar de contra-ègúns e se abster de sexo e bebidas. Os ancestrais devem ser reverenciados, juntamente com Èsú para que tudo possa ocorrer bem. É necessário fazer ípádè com frequência, cercar a casa com ébò, acaçá, ovos, Dèbúrú, etc. e fazer vários èbós, com objetivo de purificar o ambiente e trazer a energia divina dessa grande senhora.
Na cultura ioruba, o culto a Nànàn está completamente ligado a Òmóòlú. Em suas lendas, Nànàn teria abandonado seu filho devido à uma doença contagiosa que o mesmo havia adquirido.

Em sinal de arrependimento, Nànàn fez um cetro de palha chamado íbírí, em forma de uma criança recém-nascida, onde carrega todas as pragas e doenças, mostrando a ligação entre a vida e a morte. É cultuada no Òlúbájé juntamente com seu filho Òmóòlú e todos os demais Òrísás da família da terra.
Variações do culta a Nànàn:
·         Nànàn gbúlúkú- vem nos caminhos de íkú. Nessa forma seria a própria representação da morte, não sendo iniciada. Está relacionada ao princípio do mundo e ao elemento terra. É a mãe para os povos fon. Seria o verdadeiro nome dessa divindade, filha de Mawu e Lisá. Veste branco, palha da costa e muitos brajás;
·        Nànàn Ígbáíyn- vem nos caminhos de Òmóòlú, Òsúmárè, Íyámí Òsóòròngá, Íkú e Òsáàlá. É a mais temida devido a sua ligação com a morte e os ancestrais. Veste branco e azul e representa o centro da terra. É muito quente e agitada, sendo uma grande guerreira. Segundo os ítóns, seria esta Nànàn eu guerreou com Ògún;
·        Nànàn Ádjápá- vem nos caminhos de Òsúmárè, Sàngò e Òíyá. Usa uma coroa de búzios. Rege o fundo dos pântanos e todos os animais que nele vivem. Dona da lama e do barro. Tem como símbolo o ájápá, pois de certa forma, esse animal é um réptil e se arrasta e vive na lama e nos pântanos e, mesmo sendo um dos principais animais sacrificados para Sàngò (òrísá cuja energia é completamente oposta à de Nànàn), também faz parte do cardápio desse Òrísá;
·        Nànàn Ádjáòsí- vem nos caminhos de Íyóbà, Òsún e Íyámí Òsóòròngá. É a guardiã do lado esquerdo (òsí, sendo este o lado vinculado ao gênero feminino, enquanto que o lado direito está vinculado ao gênero masculino), sendo a fundadora da sociedade Ílèkó, juntamente com Íyóbà. Tem muitos fundamentos com as èléíyés. É guerreira e agressiva, sendo extremamente feminista, odiando se quer a presença de homens em seu culto. Mora nas águas e veste azul e branco;
·        Nànàn Òbáíyá- vem nos caminhos de Òsúmárè e Òsáníyn. Nessa fase, Nànàn está ligada completamente ao elemento água. É a senhora das chuvas e temporais, sendo a dona da transformação e da mudança de tempo. Senhora da cabaça e dos búzios. É adornada de brajás e conchas e veste azul e branco;
·        Nànàn Ábènèjí- vem nos caminhos de Èsú, Òsàníyn, Òsúmárè e Íyèmònjá. Senhora das plantas em estado de decomposição que compõem o pântano e, todas as raízes e árvores que fazem parte desse ambiente. Tem ligação com Íròkò e todos os ancestrais. Veste lilás e branco;
·        Nànàn Òmíláré- vem nos caminhos de Òmóòlú, Íyémònjá e Òsáàlá. Nessa fase Nànàn é tida como uma deusa suprema, senhora das águas, responsável pelo abastecimento do mundo através da chuva. Senhoras das plantações e da agricultura, sendo ela que nutre através das águas das chuvas e plantas, evitando que elas morram. Responsável pelo alimento retirado da terra;

Saudação: Sálúbà! Íbírí!
Sincretismo: Santa Ana;
Oferendas: Feijão preto, camarão, cebola, Mugunzá, etc;
cor: Azul escuro e branco, lilás;
Elemento: Terra e água;
Número: 13 (treze);
òdú regente: Òdílógbón;
Algumas ervas: vassourinha, taioba, mostarda, Òsíbátá;
Dia da semana: Sábado.


sexta-feira, 20 de junho de 2014

Kposu, o vodun pantera

Kposu é com certeza uma divindade que até os dias de hoje possui um culto repleto de mitos e mistérios. Com a fluente mistura de ritos, o vodun Kposu passou a ser cultuado em algumas casas de ketu como uma "qualidade" de Òmóòlú, porém nada tem haver com a divindade em questão.
Sabe-se que Yiegú nasceu da relação da princesa Aligbono com uma pantera chamada Gbekpó, adquirindo um extinto meio humano meio animal. Era guerreiro por natureza, a frente de um exercício poderoso, conquistando várias terras,  dentre elas o território que depois foi chamado de Dahomey. Yiegú então,  foi intitulado de Kposu, onde Kpó significa pantera e sú homem, ou seja o homem pantera. Kposu teve um grande legado, deixando vários descendentes em todo Dahomey, formando um clã chamado os filhos da pantera.
Era temido e respeitado devido seu temperamento imprevisível e explosivo. Agia por extinto,  sorrateiramente,  era incansável e destemido. Tantas foram suas conquistas que Kposu foi divinizado,  passando a ser cultuado como um ancestral.
Alguns historiadores confundem a qual panteão pertence o vodun Kposu, uns afirmando ser do panteão Hevioso e outros Sakpata.
O que acontece é que existiram descendentes de kposu em ambos panteões, logo ele pertence tanto ao panteão do trovão quanto da terra.
É um vodun real, usando uma ráfia de palha da costa cobrindo o rosto. Trás em suas mãos armas de guerra, dentre elas as garras de metal, símbolo de sua descendência animal.
"Dança com garras na mão e em certos momentos se transforma em pantera."
Muito se banalizou de seu culto,  mas na verdade é um vodun repleto de fundamentos e raro, por este motivo seus vodunsis são quase extintos.
Representa a luta,  a força,  o poder. Também é caçador,  tendo a propriedade de trazer fartura e abundância. É arredio, gostando de ser agradado de madrugada,  horário onde a pantera é ativa.
Antigamente pouco se falava de kposu e, quando os mais velhos diziam seu nome, tocavam os dedos no chão,  saudando a poderosa pantera, aquela que não tem medo de nada, sendo perigosa por agir conforme seu extinto.
Suas cores ritualisticas são o preto e o coral e seu dia da semana é a terça-feira.
É saudado por Dangbára kpó! Ahoboboy kposu!

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Óbà ou Íyóbà

Óbà ou Íyóbà é uma divindade misteriosa, cujo culto se tornou escasso, assim como seus filhos iniciados. Pouco se sabe sobre sua origem, mas contam as lendas africanas que Óbà nasceu do incesto de Òrúngàn em sua mãe Íyèmònjá. Óbà era uma grande guerreira, que não temia ninguém. Tinha prazer em batalhar, travando disputas como muitos deuses. Sua principal batalha foi com Ògún, o senhor da guerra. Antes da batalha, Ògún consultou um gbágbáláwò, que o orientou a fazer uma oferenda no local onde iriam batalhar, constituída de uma pasta feita de quiabo. Assim foi feito e quando começou a batalha, Ògún foi conduzindo Óbà para o local onde tinha essa oferenda. Óbà escorregou e Ògún a possuiu ali mesmo, tornando-se seu primeiro marido. Mais tarde Óbà teria se casado com Sàngò sendo sua terceira esposa. Dividia o coração de seu amado com Òíyá e Òsún, sendo a mulher que o grande rei era mais afastado. Cabia a Óbà prender o rei pela barriga, preparando deliciosos pratos. Mesmo assim, Sàngò ainda dava mais atenção e carinho à Òsún, a mais jovem e bela de suas esposas. Óbà indignada foi até a beira do rio onde Òsún costumava se banhar e se olhar em seu ágbègbè e, perguntou o que Òsún fazia para ter o amor e a atenção de Sàngò. Òsún esperta e maliciosa, aproveitando que estava com um torço que escondia suas orelhas, disse para Óbà que havia cortado sua orelha para preparar o ámálá de Sàngò. Óbà, desesperada para ter a atenção do marido, pôs-se a cortar sua orelha esquerda e enfeitou o prato preferido de seu amado com a iguaria. Sàngò, o rei de Òíyó, quando viu Óbà mutilada e a orelha dentro de sua comida teve repugnação, expulsando Óbà de seu reino e deixando de ser seu marido. Óbà possuída por um sentimento de ódio jura se vingar de Òsún e, parte para cima da grande Íyágbá, armada de sua espada. As duas deusas travam uma terrível batalha que só é interrompida pelos gritos de Sàngò, com voz de trovão, assustando as íyágbás, que correndo apressadas se tornaram dois rios. Na África o rio Òsún e o rio Óbà se cruzam, tendo neste local, águas revoltas e turbulentas, lembrando a batalha das duas divindades. Outra lenda conta que Óbà após ter sido expulsa de Òíyó por ter cortado a orelha, se isola em uma ilha, encontrando lá um grande caçador, com o qual se casa e finalmente encontra carinho e atenção. Torna-se então uma grande caçadora, deixando de guerrear e se dedicando a sua aldeia. Partia para a floresta, mata à dentro, em busca de grandes caças, munida de Òfá (arco e flecha) e Òzí (seta ou arpão).
Após ter sofrido tanto em sua vida amorosa, Óbà um pouco mais velha, em seu isolamento, repudia os homens, se tornando uma divindade feminista, criando a sociedade Ílèkó ou èlèkó que tem como base o culto à Íyámí Òsòròngá, as grandes feiticeiras que representam os ancestrais femininos. É chamada de íyá (mãe) Òsí (lado esquerdo), ou seja, a mãe da esquerda, onde o lado esquerdo dentro do culto está intimamente ligado às mulheres.
Óbà tem um temperamento arredio, sendo muito geniosa e agitada. Seu temperamento iguala ao de Òíyá, tendo muito em comum com a grande deusa dos ventos e tempestades. Óbà é a senhora da cozinha de santo (ílè ídànà), sendo responsável pelo preparo de todos os alimentos e oferendas. Em respeito a seu poder e sua importância, quando cozinhamos para as divindades, colocamos uma vela acesa e um copo com água na cozinha, obtendo dessa forma a permissão de Óbà para fazer o preparo das oferendas. A cozinha de santo é um lugar sagrado, onde existem muitos preceitos para aqueles que a utilizam, sendo manipulada apenas por mulheres. Óbà é a senhora da íyágbásé, mulher iniciada de íyágbá, designada pelos òrísás para cozinhar oferendas e ègbós.

Quando manifestada, sempre aparece tapando sua orelha esquerda. Não usa fílá, sendo uma grande guerreira e caçadora. É cultuada nas festividades de Sàngò, Òdé e na festa das íyágbás. Rege o amor não correspondido e o sofrimento das pessoas que perdem a pessoa amada. Tem ligação com o elemento fogo, pois se trata da senhora do preparo dos alimentos, porém também tem ligação com o elemento água, sendo a senhora das ilhas e penínsulas, regendo também os rios de águas revoltas e a pororoca. É solitária e se aproxima de Nànàn, pois Nànàn é a morte e Óbà a guerra e, guerra e morte andam lado a lado. Senhora dos relacionamentos sérios, do ciúme incontrolável e do lado possessivo do amor. 

Saudação: Óbà Sírè!
Sincretismo: Santa Joanna D'Arc;
oferendas: Abará, acarajé, vatapá, amalá;
cor: coral;
Òdú regente: ògbéògúndá;
Número: 15 (quinze);
Algumas ervas: Nega-mina, catinga-de-mulata, obó...
Dia da semana: quarta-feira.



segunda-feira, 1 de julho de 2013

Mawú, a deusa Lua

Mawú
Mawú seria para os povos fóns a maior divindade do panteão. Seu poder é comparado ao do grande Deus Supremo e em muitos lugares do antigo Dahomey, é o próprio. 
Sabemos que nossa religião é formada por vários povos oriundos de distintos vilarejos na África, logo, existe uma distorção do culto, com informações e lendas que se contrariam. A nação Djedje por exemplo, é formada por descendentes do antigo Dahomey (atual República do Benin), e é composta por histórias contadas por ancestrais de todos os vilarejos que compõem esse país, tais como Allada, Abomey, etc. Por este motivo existe um excesso de cultura e uma eventual confusão relacionada a origem das divindades. Basicamente é como se pegasse o Brasil e transformasse em uma religião e misturasse todos os povos de todos os estados. O resultado seria frevo com funk, samba com forró, os mais variados sotaques e dialetos, e toda a história cultural de cada estado, tais como lendas, fé, devoção, etc. Certamente Mula sem cabeça, Saci, Iara, dentre outros se tornariam deuses e cada descendente de cada estado, contaria sua versão sobre a divindade em questão. Parece confuso, mas foi mais ou menos isso que aconteceu séculos atrás, com a vinda dos negros para o Brasil, escravizados pelos portugueses. Por este motivo, é meio contraditório falar dos deuses africanos, uma vez que no próprio Dahomey existe várias versões para a origem e domínio de seus deuses. 
Mawú por sua vez, em alguns vilarejos é cultuada como filha de Nànàn Gbúlúkú e em outros como mãe. A segunda versão da história é a que me parece mais plausível, então irei redigir assim neste texto. Dangbé, a grande serpente da vida, teria tido quatro filhos, que seriam os primeiros deuses que compunham o panteão Fón: Mawú, Lisá, Aido Wuedo e Dangballa. Mawú seria feminino, a deusa Lua; Lisá seria masculino, o deus Sol; Aido Wuedo seria o arco-íris, o Deus o frescor e Dangballa seria sua companheira, o seu reflexo nas águas. Mawú e Lisá eram muito unidos, sendo as vezes confundidos como uma única divindade, sendo visto desta forma em algumas aldeias que compõe o Dahomey. Mawú e Lisá deram origem a muitas divindades, dentre elas a grande Nànàn gbúlúkú ou Nae Igbayn, e outros deuses que fazem parte diretamente do nosso culto, tais como Gú, Agué, Azansu, Aikuguman, Sogbo, Vodun djó, Legba e Azili (Aziri). Lisá era muito quente e arredio, tendo muitos pensamentos contrários ao de Mawú. Mawú era uma deusa benevolente, calma e que, protegia os seres humanos, trazendo paz e harmonia para a terra. Lisá por sua vez, era muito autoritário, severo e adora punir aqueles que quebravam as regras impostas pelos deuses, castigando-os. Mawú chateada com seu companheiro, se retira da terra e foi residir na Lua. Lisá se sentiu só, e retirou-se também, porém foi morar no sol. Mawú e Lisá todos os dias apareceriam sobre a terra, iluminando o planeta e vigiando de longe seus filhos. Lisá, quente e austero, apareceria de dia, onde a maioria dos seres estão ativos, prestando atenção em tudo o que se passa na terra, e continuaria punindo aqueles que erravam. Mawú apareceria de noite, onde a maioria dos seres descansavam, e traria a paz, a harmonia e o perdão para os que erram. Os seres humanos sentiram falta de Mawú, e clamavam sua volta, pedindo que os ajudassem e que olhassem por eles. Por este motivo, é comum vermos frases ou orações que clamam à Mawú pelos seres da terra, pedindo auxílio, proteção, etc (Máwu mi nô que significa Deus nossa mãe é um termo usado pelos povos fóns que exemplificam essa devoção ao vodun Mawú). Quando os colonizadores chegaram a Dahomey e viram essa veneração pela deusa Mawu, acabaram por definir que a mesma seria a deusa ou deus supremo da região, partindo daí a confusão que compara Mawú ou as vezes Mawú-Lisá como a divindade maior dos povos fóns. 
Segundo as lendas, Mawú e Lisá de tempos e tempos, ainda se encontravam, formando o que é chamado de eclipse, e nesta ocasião matavam as saudades, faziam amor e davam origem a mais voduns. 
Mawú tinha como principal sacerdotisa Nànàn gbúlúkú, que deixou um legado de como sua mãe seria cultuada. Nànàn ou Nànà seria um título dado a toda sacerdotisa da deusa lua, formando um clã feminista, uma sociedade secreta. 
Mawú é o princípio feminino, a deusa do frescor, do perdão. Seria aquela que trás os sonhos para a humanidade. Senhora do descanso, da cura e da fé. Não seria iniciada, uma vez que ao contrário de Lisá, não voltou mais a terra. Muitos sacerdotes, motivados pelo sincretismo religioso e pela necessidade de existir uma comparação entre as divindades da nação djedje, ketu e angola, acabaram por confundir Mawú com Íyèmònjá, por uma ser a mãe de muitos voduns e a outra a mãe de muitos òrísás, passando então a inicia-la em suas casas. Para nós, estudiosos e historiadores, Mawú é um vodun supremo, não tendo como iniciá-la em um neófito, porém, existindo culto e certos fundamentos para tal divindade. 
Mawú sem dúvida é uma divindade de extrema importância, tendo regência sobre a fertilidade, a vida e toda a essência do sexo feminino. Seria ela a divindade da procriação, da gestação e da propagação da vida terrena. Para os mais antigos, a lua sempre foi uma potencial influenciadora nos assuntos terrenos, agindo sobre mulheres grávidas, determinando dias para os ègbós e obrigações, interferindo na maré, dentre outros fenômenos dependentes de ações lunares e que são comprovados cientificamente. Logo, assim como o Sol, a lua possui sua importância, seja cultural ou científica, e sempre foi um astro misterioso, que encantou os seres humanos desde quando foram criados. 
Aho gbo gboy Mawú! Ahooooooooooooooo...




sábado, 11 de maio de 2013

Adjahunsi ou Ajaunsi
Seria um vodun de culto da Casa das Minas (Maranhão), oriundo de Savalú, e que teve seu culto assimilado aqui no Rio de Janeiro também. Apesar de ser um assunto polêmico pois muitos acreditam que esse vodun trata-se de uma invenção ou de um pseudônimo de Òlóògúnèdé (Divindade de culto iorubá, cultuado nas casas de ketu), Adjahunsi ou Ajaunsi passou a ter um culto forte e abrangente em muitas casas de culto djedje no Rio, sendo contados ítóns (lendas) que afirmam a existência dessa divindade. 
Segundo os mais velhos, em Savalu, norte de Dahomey, existia um habilidoso caçador chamado Azaká. Esse caçador tinha a responsabilidade de alimentar toda sua aldeia, sendo habilidoso e famoso por sua eficiência. Azaká era conhecido por adentrar a selva, sem medo, passar dias em matas fechadas e depois voltar com caças em grande quantidade ou de grande porte, saciando a fome de seu povo. Era irmão de Agongone e Tôpa, voduns esses que também possuem culto na Casa das Minas e também eram caçadores. Tinha como sobrinhos Azowani e Otolu, e comumente saía para caçar com eles, preparando Otolu para sucede-lo futuramente. 
Certo dia Azaká em uma de suas espreitadas pela mata, encontra uma linda Togbosy (vodun feminino das águas) e encantado, acaba por sucumbir-se ao desejo, tendo relações com a linda mulher. Azaká então, volta a sua cidade, perdendo o contato com essa misteriosa Togbosy, sem saber que daquele encontro surgiria uma vida. Essa Togbosy havia engravidado do habilidoso caçador Azaká, dando origem a Adjahunsi ou Ajaunsi. 
Adjahunsi foi criado no reino das águas, junto as demais Togbosys. Rapidamente, mostrou-se ser habilidoso para caça e para pesca. Vivia a maior parte de seu tempo a pescar, se aventurando nos rios mais revoltos, onde vivem os maiores peixes. Usava como artefatos um arpão que tanto servia para pescar quanto para caçar nas matas e uma rede (dam). Aprendeu os segredos das Togbosys e por esse motivo não poderia mais sair do reino das águas, sendo sempre cultuado junto a elas. 
É fato que sua lenda é muito parecida com a história contada sobre o òrísá Lògún-èdé, onde Azaká (o caçador) seria Òdé e a Togbosy (ninfa das águas) seria Òsún. Porém devemos lembrar que muitos voduns por mais que tenham características em comum com os òrísás, são divindades a parte, devendo ser assim cultuadas. Sogbo tem muito haver com Sango, Vodun Djó é parecida com Òíyá, Agué similar a Òsàníyn (...) e por mais que dividam lendas, costumes e cores, são divindades diferentes. 
Contam outras "estórias", que Ajaunsi seria um apelido dado por "malukos" (erês) a uma mulher de Salvador que, iria se iniciar no Ketu para o òrísá Lògún-Èdé e, que acabou por se iniciar no Bogun para Òdé.
Outros afirmam que, por Lògún-èdé ser um Òrísá de culto Ketu e, por razões específicas, não ter espaço para culto nas casas matriz de djedje, Adjahunsi seria uma forma de iniciar seus filhos no culto, disfarçando-o de vodun, tendo desta forma menos preconceito para cultuá-lo.
Sendo Lògún-Èdé disfarçado ou sendo vodun a parte, Adjahunsi acabou ganhando espaço no culto, tendo cantigas e fetiches que o difere do òrísá em questão, passando a ter muitos filhos e ritual próprio, por mais que exista uma grande mistura e confusão entre culto ao òrísá e culto ao vodun. 
Adjahunsi, assim como o vodun Azaká, pertence ao panteão de Sakpatá, rei de Savalú. É cultuado nos rios revoltos e agitados, onde existem os mais variados tipos de peixes dos mais variados tamanhos. Mesmo sendo um hábil caçador, não pertencia ao clã dos Hundevalú (título dado aos grandes guerreiros-caçadores), pelo fato de não ter conhecido seu pai Azaká, não possuindo então nenhum vínculo com o grande caçador de Savalú.
Adjahunsi pertenceria a um outro Clã, chamado de Adjahun, onde faziam parte os pescadores das águas doces, que exploravam os rios e alimentavam suas aldeias-cidades com pesca. 
Seria comumente confundido também com o vodun Averekete, porém nada tem em comum, a não ser o fato de serem pescadores, um dos rios e o outro dos mares. 
Dentro do culto, Adjahunsi é um vodun jovem e alegre. Seria responsável pelo aprendizado das crianças, ajudando-as em sua fase de crescimento e ensinando-as a falar, brincar e se desenvolverem. Rege a  pureza, a inocência e a alegria, protegendo todas os jovens e tendo a propriedade de manter a juventude dentro de cada ser humano, independente de sua idade.
Pertencem ao seu domínio os rios revoltos e todos os animais que vivem tanto nas águas quanto na terra, tais como anfíbios, répteis e alguns pássaros. 
Trás consigo o arpão, a rede, vara de pescar, anzóis e penas. Veste Azul em sua maioria e em todas as tonalidades, com alguns detalhes pratas e dourados. 
É cultuado nos rituais aos voduns das águas, sempre estando ao redor das Togbosys. Recebe como oferendas peixes de água doce, grão de bico, ovos, frutas e doces. 
Ahoooooooooo!!!!

sexta-feira, 19 de abril de 2013


Áíyrá
Hoje em dia no Brasil falar de Sàngò sem falar de Áíyrá é quase impossível por seus cultos estarem interligados. Os sacerdotes desprovidos de cultura, cultuam Áíyrá como uma qualidade de Sàngò o que não está completamente errado, uma vez que com o passar dos tempos,  o modo de tratar desse òrísá foi perdido e junto sua identidade, absorvendo muito dos aspectos de Sàngò. Porém, alguns sacerdotes vêm resgatando o culto a essa divindade, trazendo a público suas cantigas, suas variações e seus rituais, deixando bem claro a diferença entre ambos.
Áíyrá é originário de Sávé, província que faz divisa com Dahomey, sendo chamado lá de Sádántàn (Xadantã). O território de Sávé foi invadido e dominado por Sàngò, tornando-se mais uma província de Òíyó. Seus habitantes foram escravizados e Áíyrá passou a servir Sàngò. Em pouco tempo, Áíyrá ganhou a confiança do rei e passou a liderar o exército de Òíyó, sendo a segunda pessoa mais importante do reino. Contam às lendas que Òsáàlúfón, o rei de Ífón, que era muito amigo de Sàngò, viria a Òíyó fazer uma visita ao grande Ògbá. Antes, como o manda o costume africano antes de fazer grandes viagens, Òsáàlúfón procurou um gbágbáláwò para consultar o Ífá. No jogo Èsú pediu que fosse agradado antes de partir e ainda mandou Òsáàlúfón levar consigo sabão da costa e duas mudas de roupas limpas. Òsáàlúfón acatou a mensagem de Ífá, mas como era teimoso, negou a agradar Èsú e partiu levando consigo apenas uma muda de roupa e o sabão da costa. Èsú se sentiu ofendido e estava disposto a transformar a viagem do grande òrísá um verdadeiro inferno. Òsáàlúfón começou sua viagem, montado em cavalos brancos quando deu de frente com um homem velho, de roupas surradas, carregando um barril pesado de dendê. Òsáàlúfón, òrísá da bondade e da pureza, pôs-se a ajudar o homem a carregar o barril quando, de uma só vez, em um movimento rápido, o homem vira o barril em cima de Òsáàlúfón, sujando toda a sua veste branca. O homem mostrou sua verdadeira face, ele era Èsú, em sua forma Èsú Ákúpá, o senhor do dendê, que gargalhando e zombando de Òsáàlá, disse que o mesmo tinha virado farofa de Èsú. Òsáàlá, senhor do branco extremo, tinha como uma de seus principais èwós o dendê e, enquizilado, foi até o rio mais próximo, tomou o banho com o sabão da costa, vestiu a muda de roupa limpa que tinha levado e fez um ègbó com a roupa suja, dando nós e jogando ao rio. Òsáàlúfón continuou sua viagem quando mais uma vez deparou-se com um homem, só que esse carregava um pesado saco de carvão. Òsáàlúfón ficou receoso em ajudar o pobre homem, pois tinha acabado de ser enganado por Èsú, mas dotado de uma bondade infinita, pôs-se a ajudar novamente. Mais uma vez o homem era um dos disfarces de Èsú, em sua forma Èsú Èlèdú o senhor do carvão, furando o saco e sujando toda a suas vestes, gargalhando e zombando de Òsáàlúfón, dizendo que o mesmo tinha tornado um Ègbó. Òsáàlá também tinha como èwó o carvão, mas como havia contrariado as ordens de Ífá levando só uma muda de roupa, não tinha como se trocar. Por estar já na fronteira com Òíyó, resolveu continuar a viagem, e quando chegasse ao território de Sàngò trocaria sua roupa e se banharia. Com a proximidade de seu objetivo final, Òsáàlúfón se depara com dois lindos cavalos perdidos nos arredores de Òíyó. Foi quando reconheceu os animais, pois ele mesmo os havia dado para seu amigo Sàngò de presente. Acreditando estar levando os cavalos novamente para o grande Ògbá, Òsáàlá conduz os animais para Òíyó quando é surpreendido por Áíyrá e parte de seu exército. Acontece que existia um ladrão de cavalos na região e, deixar os animais como se estivessem perdidos fazia parte de uma armadilha de Áíyrá para pegar o ladrão. Òsáàlúfón foi confundido com o ladrão e imediatamente preso. Ele afirmava ser Òsáàlá, o rei de ífón, mas Áíyrá não acreditou. Como poderia o grande òrísá do branco estar sujo como um mendigo? Òsáàlá foi jogado no calabouço e ficou por lá longos sete anos. Durante esse período, Òíyó passou por momentos ruins, sofrendo com seca, fome, mulheres estéreis, pragas e doenças. Sàngò não sabia mais o que fazer e desesperado procurou um gbágbáláwò para ver o que Ífá o aconselharia. O òdú Èjílásègbòrá mèjí disse para o grande rei que o mesmo estaria cometendo uma grande injustiça e, como poderia o justiceiro de Òlóòrún ir contra a sua virtude. Mandou Sàngò procurar entre seus presos, pois lá encontrava um poderoso òrísá e, que fizesse de tudo para agradá-lo, pois só assim seu reinado voltaria a ser como era antes. Sàngò no mesmo instante foi em seu calabouço e de longe reconheceu seu amigo Òsáàlá, sujo e debilitado. Seus olhos cravejaram de lágrimas e sua ordem foi única: “Ordeno todos os habitantes de Òíyó, a ir aos rios mais límpidos e transparentes, para pegar água e banhar o grande rei de Ífón. Todos devem trajar branco em sua homenagem”. Assim foi feito e, todos seus súditos trajando branco, trouxeram em porrões enfeitados com laços, as águas dos rios. Fizeram um grande banquete para agradar o grande Òsáàlá a base de bastante inhame pilado, ègbò, acaçá, vinho de palma e como tempero apenas o azeite de oliva, substituindo o sal e o dendê. Sàngò para corrigir seu erro, castigou Áíyrá, seu fiel aliado que passaria a servir Òsáàlúfón em seu reino e, deveria levar Òsáàlá nas costas de Òíyó à Ífón. Assim foi feito e antes de chegar a Ífón, Òsáàlá ainda passou por Èjígbò, terra de seu filho Òsóòguíyàn, onde foi ovacionado com uma grande festividade.
Essa lenda conta um pouco da história desse grande Òrísá chamado Áíyrá que, passou a vestir branco e servir Òsáàlá em ífón. Áíyrá não usa ádè (coroa) pois não é considerado rei. Usa torço ou filá e em suas mãos carrega um sérè prateado, uma chave e um òsè somente (em algumas casas não usa òsè). Não come dendê e nem sal e seu ámálá é feito com peito de frango e quiabos cortados em lascas. É o senhor do ájègbó e da fava de árídàn. Sua gamela é redonda e seu ígbá coberto com tampa de metal. Tem propriedade sobre o òrí das pessoas, mantendo o equilíbrio do corpo sobre a terra. É o senhor das comueiras, tendo a responsabilidade de manter a casa equilibrada, olhando pelo sacerdote, todos seus filhos e clientes. Muito tem em comum com Sàngò devido a mistura de cultos, porém tem vestimenta, cantiga, rezas, oferendas, ritos e fundamentos à parte.
Uma das principais homenagens à esse Òrísá é a fogueira de Áíyrá (também chamada fogueira de Sàngò), que é feita em junho, próximo a data de comemoração à São João, santo católico com o qual Áíyrá é sincretizado. Dança Álújá e Águéré e, caso Òsáàlúfón estiver manifestado, o carrega nas costas, lembrando sua história terrena.
Algumas Qualidades de Áíyrá:

·        Áíyrá Íntílè- vem nos caminhos de Íyèmònjá, Òsún e Òsáàlá. Não é colocado em cima do pilão. É essa qualidade de Áíyrá que carrega Òsáàlúfón nas costas. Teria tentado por Òsáàlá contra Sàngò dizendo que o mesmo era o verdadeiro culpado de Òsáàlúfón ter passado sete anos preso em Òíyó. Trás em suas mãos um Òsè de madeira;
·        Áíyrá Mòdé- também chamado de Álámòdé ou ígbòmín, vem nos caminhos de Òsún, Íyèmònjá, òdé e Òsóòguíyàn. É o companheiro de Òsóòguíyàn nas batalhas. Veste branco e azul, usa filá e trás em suas mãos um èrúkèrè. Tem ligação com as águas de rios e açudes. Domina as chuvas e os trovões e representa a luz que clareia os céus quando relampeja;
·        Áíyrá Ígbònàn- também chamado de òmóíjí, esse Áíyrá vem nos caminhos de Ògún, Òsáàlá, Sàngò e òíyá. É considerado o pai do fogo e é o senhor da fogueira. É enquizilado e arredio, podendo cuspir fogo pela boca e narinas assim como Ígbárú. É o senhor do fogo azul e veste branco com adornos azuis. Carrega uma chave nas mãos;
·        Áíyrá Òsí- também chamado de Ádjáòsí, vem nos caminhos de Ógbà, Sàngò e Òsáàlá. Nessa fase, Áíryá é devoto de Sàngò, servindo fielmente o grande rei. Foi casado com Ógbà e em outras lendas teria sido amante. É dono do camelo e de todos os animais que vivem no deserto. Senhor do deserto e das regiões áridas;
·        Áíyrá Áíyrá- vêm nos caminhos de Òsáàlúfón, Òsáàguíyàn e Ògún. É chamado apenas de Áíyrá, pois seria a essência das demais variações. Veste branco ao extremo e é completamente ligado à Òsáàlúfón. Seu assento fica no quarto de Òsáàlá, em cima de um pilão de madeira crua. É necessário assentar para os filhos desse Òrísá Ògún Ájá e Òsáàlúfón, pois sem esses Òrísás seus filhos não tem caminho;
·        Áíyrá Òsúgbúrú- vem nos caminhos de Èsú. Representa o arrependimento de Áíyrá por ter cometido o grande erro de ter preso Òsáàlá por engano e ter feito o mesmo ficar preso durante sete anos nos calabouços do reino de Òíyó. Não é iniciado e veste preto;
Saudação: Áíyrá lè!
Cor: vermelho e branco;
Sincretismo: São João Batista;
Elemento: fogo;
Número: 06 (seis), 08 (oito) e 12 (doze);
Òdú: èjíònílè;
Dia da semana: quarta-feira;
Oferendas: ámálá, ájègbó, acaçás, ègbò, frutas, doces, èmú, frangos, galinha d’angola, cabritos, cágado, pombos, etc.;
Ervas: folha do caruru, alevante, erva-de-São-João, íròkò, algodão, etc.


quinta-feira, 18 de abril de 2013


Òsáàlá é um assunto muito complexo dentro do culto. Todo òrísá fúnfún, ou seja, pertencentes à classe dos òrísás presentes desde o início do mundo e que veste branco, são considerados um Òsáàlá. Nesse caso, Ògbáàtálá, Òdúdúwà, Òràníyàn, Ájálá, Ísálé, Òsáàlúfón, Òrúnmíllá, Òkò, Òlóòròkè, Èfèjó, Ákànjápríkú, áròwú, Òsáàguíyàn, dentre outros, são Òsáàlás e cada um possui uma história dentro do culto e foram grandes reis, fundadores de povoados e vilarejos.
Os mais conhecidos Òsáàlás são Òdúdúwà o fundador de Ífé e Ògbáàtálá o fundador de Ágbéòkútá e governante supremo dos povos Ígbò. A disputa entre esses dois òrísás pela criação do mundo, pelo domínio da terra e pelo poder absoluto, foi o tema de várias lendas africanas. Na África o nome Òsáàlá é diretamente ligado à Ògbáàtálá, aquele que segundo os mais velhos foi incumbido pelo próprio Òlóòrún ou Òlóòdúmárè (o deus supremo) de criar o mundo e a humanidade. Já aqui no Brasil, o nome Òsáàlá está diretamente ligado à Òsáàlúfón, o senhor da cidade de Ífón.
Òsáàlúfón seria o grande rei, filho de Ògbáàtálá e herdeiro da terra, sendo chamado de Òlú Áíyè (senhor da terra). Assim como seu pai, carrega em suas mãos o Òpáàsòrò, cajado feito de estanho, símbolo da Supremacia e da hierarquia.
Foi casado com Nànàn e Íyèmònjá e seu culto é expandido até mesmo entre os dahometanos e os demais povos africanos. Muitas são as suas lendas, relatando detalhes de sua vida poligâmica, mas sempre deixando claro o quanto era bom, justo e sensato. Tinha o poder supremo, sendo respeitado por todos os demais ímòlés. Munido de seu cajado de estanho e vestes brancas como a nuvem, Òsáàlúfón representa a figura de um ancião, sábio, senhor da integridade e digno de respeito.
Às vezes se mostra ranzinza e enquizilado. Gosta de tudo em ordem, limpo e organizado. Sempre fazia visitas a seus filhos e amigos, sendo mais agarrado à Òsáàguíyàn, que herdou a linhagem dos òrísás fúnfún. Certo dia visitou Sàngò nas terras de òíyó e acabou por ser vítima de uma armadilha feita por Áíyrá, líder do exército da cidade, sendo confundido com um ladrão e largado na prisão por longos sete anos. Sàngò após ter visto o erro que seu exército cometera com o grande Òsáàlá, mandou que todos os habitantes de Òíyó se vestissem de branco, fossem aos rios mais próximos e trouxessem águas cristalinas, banhando Òsáàlúfón e fazendo uma grande festa, repleta de ègbò, acaçá e demais iguarias temperadas apenas com azeite de oliva. Até hoje esse ritual é repetido e os barracões celebram “As águas de Òsáàlá”, onde os adeptos se vestem de branco, rezam e levam água em quartinhas, lavando os assentamentos e o quarto de Òsáàlá e depois fazem uma grande festa em homenagem ao senhor de Ífón. Após o erro ser corrigido, devido a sua debilidade nas pernas agravada pela prisão e maus tratos, Òsáàlúfón mal andava. Áíyrá por sua vez, foi castigado por Sàngò, tendo que carregar Òsáàlúfón até Ífón nas costas e passando a servi-lo, sendo seu cervo.
Nànàn foi à primeira esposa de Òsáàlúfón. Ela era de Dahomey, cidade que fazia fronteira com Ífón. Com Nànàn, Òsáàlá teve três filhos: Òmóòlú (Sakpatá), Òsúmárè (Ákólò Gbèsén) e Íròkò (Lòkò), voduns dahometanos que passaram a ser cultuados pelos iorubas. Depois, Òsáàlá se casou com Íyèmònjá, a grande filha de òlóòkún, tendo com ela Òsáàguíyàn, Òsànýn, Òkò, Ájè Sálúgá, Òsún, Òíyá, Ógbà e os gêmeos Ígbèjí. Alguns ìtàns revelam divergências entre as esposas de Òsáàlá, sempre disputando o amor e a atenção do marido. Nànàn era a mais velha e Íyèmònjá a mais nova. Certo dia Òsáàlúfón partiu para uma viagem que levaria sete dias. Íyèmònjá convenceu Nànàn a tomar banho de lama para rejuvenescer e melhorar a aparência. Enquanto Nànàn ficou sete dias no pântano, Íyèmònjá se banhava com água fresca, se enfeitava e se perfumava, aguardando o retorno de Òsáàlá. Sete dias se passaram e Òsáàlúfón voltou para o palácio, sendo recebido por Íyèmónjá, trajada com uma linda veste branca, limpa e perfumada. Íyèmònjá indagou sobre o estado mental de Nànàn, dizendo para Òsáàlúfón que a mesma estava ficando caduca, pois ficou sete dias no pântano junto com cobras e sapos. Òsáàlá foi averiguar e se deparou com Nànàn imunda, dentro do pântano, vestida com uma roupa suja e coberta de lodo. No mesmo instante Òsáàlá repudiou Nànàn, separando-se da íyágbá.
Outras lendas contam uma eterna rivalidade entre Èsú e Òsáàlúfón. Èsú era o grande mensageiro de Òrúnmíllá e para os òrísás receberem mensagens de Òlóòrún
dependiam de Èsú. Todos rendiam homenagem ao grande poder de Èsú, porém Òsáàlúfón orgulhoso recusava-se a reverenciar Èsú, até por que Èsú era o seu avesso, gostando de tudo o que era Èwó para Òsáàlá (dendê, òtín, carvão, sal, fumo, preto, etc). Em uma determinada ocasião, Òsáàlúfón e Èsú discutiam quem era o mais antigo no mundo. Èsú afirmava ser ele o mais antigo e Òsáàlúfón negava, afirmando já existir no Òrún antes de Èsú e a terra serem criados. O desentendimento entre eles foi tão grande, que os dois òrísás foram convidados a lutarem entre si, diante dos demais ímòlés, reunidos numa assembleia. Como o de costume, Èsú e Òsáàlá consultaram Ìfá antes do confronto. Eles foram orientados a fazerem determinadas oferendas. Èsú confiante que venceria o ancião, não quis perder tempo fazendo oferendas e foi para a Praça de Ífé, local da luta. Òsáàlúfón fez todas as oferendas prescritas e também se dirigiu ao local. Èsú contava com seus talismãs e sua magia para derrotar Òsáàlá e Òsáàlúfón apoiado em seu Òpáàsòrò estava confiando em sua sabedoria e em seu poder. Começa a batalha e Òsáàlá pega Èsú e lhe dá uma palmada, fazendo com que caia no chão machucado. Èsú se levanta e Òsáàlá torna a lhe bater, dessa vez em sua cabeça, transformando-o em um anão. Èsú se sacudiu e voltou ao tamanho normal. Òsáàlá então pegou a cabeça de Èsú e a sacudiu com força e violência, fazendo com que ela ficasse enorme, maior que seu corpo. Èsú esfregou a cabeça com as mãos e recuperou o seu tamanho natural. Foi então a vez de Èsú que, pegando uma cabacinha, abriu-a repentinamente na direção de Òsáàlúfón, saindo de dentro uma fumaça branca, descolorindo Òsáàlá. Òsáàlúfón se esfregou repetidamente para voltar a sua cor normal, mas foi em vão, ele não conseguia retornar a sua cor natural. Òsáàlúfón então desfez seu turbante enrolado sobre a cabeça e, daí, tirou o seu poder, um talismã, tocando com ele em sua boca e chamando Èsú que como uma marionete, ficou sobre o controle de Òsáàlá, fazendo tudo o que lhe era mandado. Todos então reconheceram o poder de Òsáàlá, afirmando que ele era maior que Èsú e os demais òrísás, que ele sim era o òrísá mais antigo e poderoso.
Òsáàlúfón tem como principal símbolo seu cajado, o Òpáàsòrò. O Òpáàsòrò é a insígnia do poder e da hierarquia. Seria ele o divisor de águas, representando o Áíyè (terra), o Òrún fúnfún (espaço sagrado reservado para os inocentes, os sinceros e aqueles que tenham pureza em suas intenções) e o Òrún Márè         (espaço sagrado reservado para os seres perfeitos e absolutos sobre o céu e a terra, onde fica Òlóòrún e os demais òrísás). É o senhor da procriação, responsável pela continuação e propagação da espécie, sendo o senhor do sêmen. Tem como principal oferenda o Ígbí (caramujo) e o Ílé (pombo branco). Seus animais a serem sacrificados, ao contrário dos demais ògbórós (òrísás masculinos) são fêmeas, simbolizando a união entre os sexos e a procriação. É sincretizado como Nosso Senhor do Bom Fim e seu principal ritual é as águas de Òsáàlá. Na Bahia, no dia do Senhor do Bom Fim os adeptos vão até a igreja de mesmo nome, trajando branco e portando jarros com águas e flores, lavando toda a escadaria da igreja e fazendo suas oferendas. Usa fílá por representar o mistério e o respeito. Senhor da sabedoria e da liturgia, sendo o òrísá mais respeitado dentro todo o culto, reverenciado até mesmo pelos demais òrísás que, se manifestam quando são entoados cânticos ou rezas para o grande Òsáàlá, o maior entre todos os òrísás.
É o ultimo Òrísá cultuado nos dias de festa, encerrando o culto.
 Suas qualidades são:
  • Ògbáàtálá- é o mais velho dentre todos os Òsáàlás. Seu nome é a aglutinação das palavras Ògbá – rei, tý – de e álá – pano branco, ou seja, o rei do pano branco. É o guardião cívico, protetor dos templos e cidades. Representa as massas de ar, as águas frias e imóveis do começo do mundo. Disputa com Òdúdúwá o posto de criador da terra, sendo aquele que recebeu a devida missão. Pai de muitos òrísás fúnfún, dentre eles Òsáàlúfón. É o Òsáàlá mais conhecido dentre todo o território africano, sendo um dos grandes deuses iorubas;
·        Òdúdúwà- é segundo as lendas o fundador de Ífé, o berço do mundo. Muitos são seus mitos e em alguns vilarejos africanos é cultuado como Òdú ou Òdúwà, a senhora da cabaça, aparecendo no aspecto feminino e tendo grandes vínculos com as Íyámí. No território de Ádò, Òdúdúwà é indiscutivelmente íyágbá, sendo a esposa de Ògbáàtálá e dividindo com ele o poder do mundo, representado pela cabaça, cuja parte de cima é masculina e pertence à Ògbáàtálá e a parte de baixo é feminina e pertence à Òdúdúwà.  Já em Ífé e na grande maioria do território africano, Òdúdúwà aparece no aspecto masculino, sendo o pai de muitos òrísás, dentre os quais se destacam Ògún, Òdé, Èsú, Òkèrè, etc; 
·        Gbágbá Áfúrú- demarcação qualificativa dos caminhos de Òsáàlúfón, onde nesta fase Òsáàlá é completamente coligado ao elemento ar, representando o sopro divino (èmí), usado por Òlóòdúmárè nos seres humanos com a finalidade de dar-lhes a vida. Senhor da atmosfera e do oxigênio, tendo a propriedade de fazer com que o ar da terra nunca acabe. Rege os pulmões e os demais órgãos ligados a respiração. Representa o último suspiro, sendo responsável também pelo desencarne, estando ligado tanto a vida quanto a morte;
·        Gbágbá Òfúríkàn- também chamado de Fúríkàn ou Òdídè, essa fase de Òsáàlúfón é responsável pela aceitação e transporte de tudo o que é oferecido para os Òrísás. Antes de se entregar ou levantar qualquer oferenda ou ègbó, bate-se três vezes com a mesma no chão, dizendo-se “òdídè òdídè Ágò!”, desta forma pedindo licença á Gbágbá Fúríkàn. Senhor do descanso e do repouso, responsável por repor as energias, através do sono;
·        Gbágbá Òdè- Fase de Òsáàlúfón ligada diretamente à velhice. É responsável pelo bem estar e pela boa qualidade de vida dos idosos. Senhor da sabedoria dos anciãos, fazendo com que sejam respeitados por suas experiências de vida. Tem a propriedade de proteger os mais velhos, cobrando diretamente aqueles que maltratam e desrespeitam os idosos. Rege o lado infantil da terceira idade;
·        Gbágbá Òlètúndè- fase de Òsáàlúfón ligada ao corpo e ao caráter. Rege a individualidade do ser humano, frisando a tese de que ninguém nesse mundo é igual, todos são diferentes. É o dono das impressões digitais e dos dedos das mãos. Senhor da honestidade e da integridade, castigando os que vivem a margem da sociedade;
·        Gbágbá Èpá- fase de Òsáàlúfón ligada diretamente ao Ògbí (noz de cola). Rege todos os rituais onde esse fruto é consagrado e ofertado, respondendo diretamente por todos òrísás no jogo de ògbí. Foi ele que ofertou o ògbí roxo para Èsú e Íyá Tònàn. Sua principal quizila é o òkòtílé (broto do ògbí) e, por este motivo é que os tiramos do Ògbí antes de ofertar à òrí, ígbá, ídí òrísá e oráculos;
·        Gbágbá Ápáàlá- fase de Òsáàlúfón coligada diretamente aos caminhos de Sàngò e Áíyrá. Rege o lado positivo de Áíyrá, tendo-o como seu principal e leal servo. Este Òsáàlúfón representa o ítàn cujo Òsáàlá é carregado até seu castelo em Ífón por Áíyrá. Possui como símbolo o ponto central do Òsè (machado de duas lâminas);
·       Gbágbá Ájálá- senhor do òrí, sendo chamado de gbágbá òrí. É o senhor de todas as cabeças, responsável por modela-las e protege-las. Segundo os ìtàns, antes do ser humano vir a terra, ele escolhe seu òrí na prateleira de Ájálá e logo depois recebe o èmí (sopro da vida dado por Òlóòrún). Após receber o èmí ele vai até ònígbòdè (o guardião do outro mundo) e se apresenta, relatando tudo o que vai fazer e ser na terra, podendo depois nascer. Ájálá não é uma qualidade de Òsáàlúfón e sim um òrísá a parte coligado a sua cultura por ser um Òsáàlá, ou seja, um òrísá fúnfún. Não é iniciado em nenhum neófito, sendo cultuado no ígbá òrí juntamente à Ìyá Másè;
·       Gbágbá Ísálé- òrísá fúnfún a parte, não sendo uma qualidade de Òsáàlúfón. Muito velho e poderoso, Ísálé é o senhor da humanidade, responsável pela sua evolução e por sua continuidade, evitando catástrofes e doenças que poderiam de uma vez só erradicar a vida humana na terra. Recebeu diretamente de Òlóòrún a missão de proteger os seres humanos e fazer com que caminhemos corretos para com as leis divinas e os mandamentos do Deus Supremo;
·       Gbágbá Lèjúgbè- Também chamado de òrísátèkó, vêm nos caminhos de Áíyrá, Íyèmònjá e Òdúdúwà. É um Òrísá fúnfún a parte coligado a cultura de Òsáàlúfón por ser muito velho e devagar. Tem como principais oferendas carnes brancas. É o grande Òsáàlá cultuado na região de Sávé que fazia parte da comitiva de Òdúdúwà;
·       Gbágbá Ájáguèmó- Òsáàlá cultuado em Èdé, tendo um culto a parte e sendo um antigo òrísá fúnfún. Tem como maior símbolo o Águèmó (camaleão), animal de extrema importância para os iorubas e presente desde o inicio do mundo. Conhecido por anualmente promover um “combate de mímicas” disputado entre Gbágbá Ájáguèmó e Òlúníwí;
·       Gbágbá Álásé- Òsáàlá cultuado em Ípòndá. Òrísá fúnfún responsável por abastecer o mundo através das chuvas. É o grande salvador da humanidade, pois quando a terra passava por um grande período de seca, foi Gbágbá Álásé que fez chover e salvou os seres humanos. Cultuado como o senhor das nuvens;
·       Gbágbá Òkò- também chamado apenas de Òkò ou Òlágbírín, é um òrísá fúnfún presente desde o principio da humanidade. Vêm nos caminhos de Ògún, Òsànýn, Òsóòsí e Òmóòlú. É o grande senhor dos campos, da agricultura, das sementes e das favas. Segundo as lendas, Òkò ganhou de Ògún ferramentas para poder arar a terra, facilitando o plantio e o cultivo dos vegetais. Responsável por tudo o que a terra oferece como refeição, tendo a propriedade de trazer o alimento à mesa de cada ser humano. Usa cajado de madeira e uma flauta de osso. Também era um exímio caçador, que transportava as riquezas do campo para a sua casa;
·       Gbágbá Ákànjápríkú- Òrísá fúnfún originário das terras de Ífón. Seria um Òsáàlá muito velho e arredio, cultuado inicialmente na casa do Òpò Áfónjá - BA. Está presente desde o início do mundo e representa os antigos anciãos e a sabedoria dos mais velhos. Tem fundamento com a ancestralidade, sendo cultuado aos pés do Íròkò, árvore da qual se tira a madeira para a construção de seu cajado;

Saudação: Èsè ò èpá gbágbá! Ímòlé! Lésé Lésé!
Cor: branco;
Filiação: Ògbáàtálá;
Sincretismo: Senhor do Bom Fim;
Elemento: ar, terra e água;
Número: 10 (dez) e 16 (dezesseis);
Òdú: Òfún e Áláàfíá;
Dia da semana: sexta-feira;
Oferendas: acaçás, ègbò, frutas, doces, èmú, galinha d’angola branca, cabras, frangas, pombos, ovelha, ìgbí, etc.
Ervas: Manjericão branco, colônia, folha da costa, malva branca, algodão, boldo, barba de velho, alecrim, alfavaca, etc.


Òsáàguíyàn 
Trata-se de uma divindade fúnfún jovem, filho de Òsáàlúfón e Íyèmònjá. Seu nome era Ákínjòlè, mas passou a ser chamado de Òsáàguíyàn, Òguíyàn ou Òsóòguíyàn, pois gostava muito de íyàn (inhame). Nasceu em Ífé, muito antes de Òsáàlúfón conquistar a cidade de Ífón. Por ser um grande guerreiro, decidiu ter seu próprio reino, partindo acompanhado de seu amigo Áwòlèdjè, um grande gbágbáláwò, que sempre o aconselhava durante sua trajetória.
Ficou conhecido nas terras de Ògbómónsó como Èlèmòsó, o senhor dos belos ornamentos, devido a sua linda roupa de guerra, toda em metal e prata.
Òsáàguíyàn chegou até as terras de Èjígbò, destronando o rei e tomando a cidade para si, sendo titulado de Èlèjígbò, o senhor das terras de Èjígbò. Áwòlèdè, seu amigo e conselheiro, mandou Òsáàguíyàn fazer determinados sacrifícios e oferendas para que suas terras prosperassem e seu reino fosse conhecido. Assim foi feito e, todos ouviam falar de Èjígbò e de seu grande rei, o comedor de inhame pilado. Com a glória e o poder, Òsáàguíyàn passa por mudanças de comportamento, forçando Áwòlèdè a seguir viagem para outras terras. Èjígbò cresceu mais e mais, se tornando uma das terras mais ricas e prósperas de toda a África.  
Certo dia Áwòlèdè retornou a Èjígbò, mas não foi reconhecido pelos guardas reais e foi mal recebido, sendo espancado e preso no calabouço do castelo.
Áwòlèdè, mortificado com os maus tratos, resolveu usar sua magia para castigar o reino de Èjígbò, fazendo com que durante um longo tempo não chovesse, trazendo a seca e a fome para a região.
Òsáàguíyàn desesperado e, sem ter seu amigo e gbágbáláwò por perto, procura outro advinho que, através do oráculo de Ífá, conta a Òsáàguíyàn que existia uma grande injustiça em seu reino, pois seu fiel amigo estava preso em seu calabouço e, este tinha entoado pragas para a cidade. Òsáàguíyàn rapidamente vai até a prisão e solta Áwòlèdè que, muito sentido por tudo o que passou, não perdoa Òsáàguíyàn e se embrenha na mata. Òsáàguíyàn foi atrás de Áwòlèdè e lhe suplicou que perdoasse sua terra. Áwòlèdé lhe concede o perdão com uma condição: todos os anos os moradores de Èjígbò, antes do período de seca, deveriam partir para a floresta densa, cortar trezentos feixes de varinhas e divididos em dois grupos, deveriam se golpear, uns aos outros, até que a varinha quebre ou se gaste.
Assim foi feito e todos os habitantes de Èjígbò, divididos nas províncias de Ísálè òdò e de Òkè Mápò, se golpearam com varinhas, lembrando o sofrimento de Áwòlèdè ao ser preso injustamente e a humildade de Òsáàguíyàn em reconhecer o erro. Após esse ritual, chamado de Lòrògún, a chuva tornou a cair e a cidade de Èjígbò tornou-se rica e próspera novamente.
Outra lenda africana relata que após a morte de Áwòlèdè, Èjígbò tornou-se a ter problemas com a seca e, seus habitantes passaram fome. Òsáàguíyàn preocupado com seu reino e temendo que sua principal comida, o inhame, se esgotasse, procurou um gbágbáláwò que pediu para que fizesse oferendas e sacrifícios, clamando a Èsú que de alguma forma trouxesse de volta a chuva ou resolvesse o problema com a fome da população. Ògún, o grande guerreiro, passava pela região de Èjígbò e ficou sabendo através de Èsú da situação do reino de Òsáàguíyàn. Para agradar e ajudar o grande òrísá, Ògún parte para mata e, auxiliado por seu exército, traz consigo inúmeros sacos de inhame, matando a fome do povoado. Òsáàguíyàn ficou muito grato à Ògún, fazendo uma grande festa chamada òjò ódò ou a festa do pilão, onde quilos de inhame foram pilados e distribuídos para a população. Em homenagem à Ògún, Òsáàguíyàn passou a usar a cor azul em seus apetrechos, lembrando sempre do òrísá que lhe ajudou na hora que seu povoado precisou.
Outros ìtàns contam que certa vez Òsáàguíyàn, ganancioso como era, queria ter o domínio sobre os mortos, roubando dos Òjés, sacerdotes do culto à ègún, o ísàn (varinha pertencente ao culto de Ègúngún, que tem o poder de invoca-los, controla-los e conduzi-los). Òíyá, deusa soberana do culto, ficou sabendo do roubo e entoando òríkís enfeitiçou o ísàn fazendo com que essa varinha dominasse Òsáàguíyàn, perdendo o controle e destruindo tudo a sua volta. Òsáàlúfón, como de costume, reunia todos os Òrísás em seu palácio em Ífón, para conversarem e discutirem sobre o futuro da humanidade. Òsóòguíyàn tinha ido nessa reunião, munido de seu átòrí e, num ato de cólera, acabou por partir para cima de todos os Òrísás, agredindo-os com sua varinha. Quando chegou próximo de Òsáàlúfón, surgiu um grande guerreiro das terras de Èkètí chamado Jágún, e prostou-se na frente do grande òrísá para protegê-lo da fúria de Òsáàguíyàn. Esse guerreiro luta contra Òsáàguíyàn que, após ter largado o átòrí, volta ao seu estado normal de consciência e pede perdão a Òsáàlúfón e a Jágún. Naquele momento Jágún é condecorado um òrísá fúnfún e passa a guardar o palácio de Òsáàlá, sendo conhecido como o grande guerreiro branco. Òsáàguíyàn por sua vez rende homenagem à Jágún e passa a ser chamado de Ájágúnàn, devolvendo o Ísàn à Òíyá e reconhecendo ela e os Òjés como os únicos capacitados a controlar os mortos.
Òsáàguíyàn rege a guerra em busca da paz. Representa o despertar do guerreiro e o início do combate. Senhor do nascer do sol e do despertar da humanidade, garantindo que o ser humano acorde todos os dias e levante de sua cama para agir sua vida.
É a divindade da juventude, da alegria e da prosperidade. Representa o combate cotidiano em busca de alimentos e conforto. É o dono do pilão (òdò) tendo o mesmo como símbolo de fartura e poder. Usa como ornamentos ídá, òfá, átòrí e uma mão de pilão. Veste branco com pequenos detalhes azuis (variando a tonalidade conforme a qualidade). Seu principal ritual é o Pilão de Òsáàguíyàn e o Lòrògún. Também é cultuado no ritual das águas de Òsáàlá.
Suas principais qualidades são:
  • Gbágbá Ájágúnàn- vem nos caminhos de Ògún, Jágún e Òíyá. Senhor do Lorogun,  sendo esta sua fase mais agitada. Usa ídá (adaga) e mão de pilão, além de átòrí. É o guardião do eixo da terra e quando irritado causa terremotos. Acompanha Ògún nas batalhas;
  • Gbágbá Pétíòdè- vem nos caminhos de Òdé, Òsún, Sàngò e Íyèmònjá. Representa a juventude, a pureza e a infância. Seria o pai do caçador de pombos, Òdé Ínlè sendo titulado por esse motivo de gbágbá – pai, Pètítì – pequeno, Òdé – caçador, ou seja, pai do pequeno caçador ou jovem caçador. É um grande caçador, senhor dos campos e planícies. É representado pelo nascer do sol;
  • Gbágbá Èpè- seria um òrísá fúnfún a parte, que aqui no Brasil, teve sua cultura aglutinada ao culto de Òsáàguíyàn. Vem nos caminhos de Òsún, Sàngò, Íyèmònjá e Òsáàlúfón. Era um grande guerreiro que morava nas colinas. Também era um exímio pescador, tendo como prato preferido o èjá (peixe) e por este motivo passou a ser chamado de Èpéèjá;
  • Gbágbá Dànkó- vem nos caminhos de Ègúngún, Òíyá, Íròkò, Jágún e Òsáàlúfón. Representa a fase de Òsáàguíyàn no qual está tomado pelo poder do átòrí e perde o controle sobre si mesmo, agredindo a todos. Muito ligado à Ègún, sendo necessário agradar sempre os ancestrais e passar variados Ègbós em seus filhos. Responsável por proteger as árvores de onde são tirados os átòrís, águídávís e ísàn. Senhor dos bambuzais (Dánkò);
  • Gbágbá Ákírè- Òrísá fúnfún presente desde o início da humanidade. É um òrísá de culto a parte que foi englobado na cultura de Òsáàguíàn. Aqui no Brasil seu culto não se expandiu muito, mas em òsóògbò na África, era considerado um grande guerreiro, rico e poderoso que, tinha o poder de castigar os aldeãos que agiam de forma contrária às leis da cidade, transformando-os em surdos e mudo. É o protetor dos surdos e mudos, tendo a propriedade de ajuda-los a se encaixar na sociedade, mesmo com sua deficiência;
  • Gbágbá Ètèkó- seria mais um Òrísá fúnfún que perdeu sua identidade e passou a ser cultuado como qualidade de Òsáàguíyàn e em algumas casas nem ser conhecido. Mora nas matas aos arredores de Ífón. Era um grande guerreiro, inquieto e muito habilidoso e por este motivo, passou a guardar a fronteira de Ífón, protegendo a cidade dos inimigos; 
Saudação: Èpè Èpè gbágbá!
Cor: branco e azul;
Filiação: Òsáàlúfón e Íyèmònjá;
Sincretismo: Menino Jesus de Praga;
Elemento: ar e terra;
úmero: 8 (oito);
Òdú: Èjíònílè;
Dia da semana: sexta-feira;
Oferendas: inhame pilado, bolas de arroz, acaçás, ègbò, frutas, doces, èmú, galinha d’angola, cabritos, frangos, pombos, coelhos, etc.;
Ervas: Manjericão branco, colônia, folha da costa, malva branca, algodão, ipê, camomila, etc.