A quaresma é designada por um período de 40 dias que antecedem a Páscoa, onde comemora-se para os cristãos a ressurreição de Jesus. Nesse período católicos e cristãos do mundo inteiro se abstém de prazeres carnais e determinados alimentos, buscando purificar-se de seus pecados e ao mesmo tempo, homenagear os 40 dias de sofrimento de seu messias no deserto e seu martírio na cruz. O Candomblé é uma religião brasileira, de origem africana, porém com grande influência do catolicismo, uma vez que negros foram trazidos da África na condição de escravos e foram forçados a deixar de cultuar suas divindades para serem catequizados pela igreja. Apesar de todo o sofrimento de nossos ancestrais, eles não abriram mão de seu panteão, apenas tentaram assimilar as duas doutrinas, surgindo então o sincretismo religioso. Com tudo isso, muito do que se tem no candomblé, desde datas específicas para cultuar determinadas divindades até mesmo alguns rituais, possuem influência da doutrina católica e das festividades de seus santos. Por exemplo, Ògún que no Rio de Janeiro é sincretizado como São Jorge, acaba por ter suas festividades e oferendas em sua maioria em Abril, mês no qual São Jorge é reverenciado. A quaresma dentro do candomblé tradicional, era tida como uma época de dificuldades, pesada, onde os Òríşás iam guerrear contra a maldade do mundo e se recolhiam para o Òrún (espaço sagrado), só retornando no Sábado de aleluia, dia anterior a Páscoa. Antes do carnaval, se fazia o ritual do Òlóòrògún, onde os Òríşás eram chamados para o áşé para prepararem seus filhos para a quaresma. No Òlóòrògún ou Lorogun, os Òríşás vinham de branco, com átòrís (varas) em suas mãos e se golpeavam, lembrando a passagem do Òríşá Òşógíyón na terra, onde ele teve que fazer este ritual para salvar seu reino da fome, da miséria, da seca e da infertilidade (Esse ritual hoje em dia é feito na festa do Pilão de Òşógíyón). Após o ritual, os atabaques eram recolhidos e cobertos, os òjúbós (assentamentos) eram cobertos com panos brancos e a casa parava suas funções. Durante esse período, seus filhos seguiam o mesmo procedimento cristão, se abstendo de carnes, sexo e bebidas e mantendo uma espécie de resguardo, pois se acreditava que com a ausência dos Òríşás, eles estavam desprotegidos e a terra estava tomada de ègúns, esperando só uma oportunidade de fazerem o mal ou até obscediar um èlègún (médium). Na semana santa, os filhos de santo se resguardavam em suas casas de áşé, devidamente trajados de branco e de íkàns (contra-ègúns). Na sexta-feira santa, eram feitas incisões em seus corpos (curas) onde acreditava-se lembrar a morte e o sofrimento de Jesus (sincretizado como Òşáàlá), e ao mesmo tempo introduzindo determinados átíns (pós sagrados) que purificavam o corpo, para que o Òríşá ao retornar da guerra, "possuísse" um corpo limpo e devidamente preparado. Depois ceiavam e rezavam para Òşáàlá, pedindo misericórdia e paz para o mundo. No sábado de Aleluia acontecia um grande şírè, onde os Òríşás eram chamados ao som do Adahun para retornarem da guerra. Então era feito um grande èbó coletivo, onde cada Òríşá, munidos de ervas e comidas, limpavam a casa e todos os presentes. Só depois então era aberto o calendário litúrgico de festividades daquela casa de áşé, onde cada divindade ia ter suas devidas oferendas e festividades em suas datas correspondentes.
*Texto de Mejitó Rômulo Dangballataví*
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