sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Obí

*Òbí*
O culto aos Voduns, Òríşás e 'Nkisis certamente é rodeado de segredos e de objetos rituais, cada um com sua importância para a evocação da divindade e de seu áşé. Entre todos os objetos rituais, alguns se destacam por serem indispensáveis ao culto, possuindo uma importância litúrgica e nos aproximando mais do sagrado. O òbí sem dúvidas é um desses "objetos" que sem sua presença seria impossível o contato com as divindades. A Noz de cola ou òbí é oriundo da árvore Cola Acuminata, de origem da faixa equarorial africana. Desta noz são feitos xaropes, bebidas e refrigerantes. 
Dentro do culto Afro, o òbí está presente desde o èbó, a iniciação e até mesmo no Sihun (áşèşè), sendo um fruto sagrado, com poderes "mágicos" e com um simbolismo extremo. 
Um ítán conta que quando o caos estava generalizado no mundo antigo, onde Òríşás guerreavam entre si aqui na terra, Èlèdúnmárè ou Òlóòrún, o Deus supremo, teria convocado as 4 divindades primordiais para uma reunião, seriam elas Áíyè (a terra), Áláàfíà (a paz), Áísíkí (a prosperidade) e Gbá (a concórdia). Ali perante o Deus supremo, as 4 divindades entraram em oração pela terra, as divindades e os humanos que nela habitavam, para que se restaurasse a paz e o equilíbrio. Neste momento, Èlèdúnmárè teria feito um gesto com a mão direita como se tivesse apanhado algo no ar, repetindo novamente o mesmo gesto. Èlèdúnmárè tinha apanhado as preces das 4 divindades, dando para que Áíyè (a única divindade feminina que participava dessa reunião) plantasse. No dia seguinte no local onde foi plantado o áwò de Èlèdúnmárè nasceu uma árvore. Ela rapidamente cresceu, floresceu e deu frutos. Áíyè colheu os frutos e levou para o Deus supremo que pediu que ela levasse os frutos e preparasse de uma forma que lhe agradasse. Primeiro ela tostou os frutos, o que fez com que mudasse de textura e ficasse muito amargo. Depois ela cozinhou, os frutos mudaram de cor e não dava pra ser comido. As demais divindades primordiais tentaram de todas as formas preparar aquele fruto para ser consumido mas foi em vão. Foi então que Èlènínì, a divindade dos obstáculos se apresentou e disse que queria guardar os frutos. Ela lavou cuidadosamente a cápsula que guardava os frutos, limpou e lavou todas as nozes. Ela guardou por 14 dias, junto com as folhas frescas e depois comeu a noz crua e viu que dava para ser consumida. Ela guardou por mais 14 dias e comeu novamente, percebendo que ela se mantia fresca. Foi quando ela levou para Èlèdúnmárè as nozes e disse que elas poderiam ser consumidas cruas sem perigo. O Deus supremo então decretou que Èlènínì seria a divindade mais velha a conseguir resolver o mistério do produto das orações e, ordenou que dali por diante as nozes não deveriam mais ser somente alimento no céu mas também onde fosse apresentadas, deveriam ser oferecidas ao mais velhos do grupo e serem consumidas apenas em conjunto com orações. Ele também determinou que a árvore cresceria apenas nos locais onde os mais novos respeitassem os mais velhos. 
O primeiro òbí foi partido pelo próprio Èlèdúnmárè, ele tinha dois gomos e foi dividido entre o grande Deus e Èlènínì a divindade mais velha ali presente depois dele. O segundo òbí tinha 3 gomos, representando as 3 divindades masculinas que participaram do momento de prece. O terceiro tinha 4 gomos, representando Áíyè a única divindade feminina que participou do momento de prece. O quarto òbí tinha 5 gomos e foi conpartilhado com Òşáàlá e o último tinha 6 gomos representando a harmonia, resultado de todas as preces que foram emanadas, dividido então por todas as divindades ali presentes. 
Áíyè então levou a noz de cola para a terra, onde sua presença é marcada por preces e onde ela só germina em comunidades humanas onde existe o respeito pelos mais velhos. 
Existem dois tipos principais de òbí, o òbí ábátá, que se divide entre 3 a 6 gomos e o òbí gbànjá, que tem apenas 2 gomos. O òbí ábátá normalmente é usado para comunicação com as divindades, porém também pode ser usado em Eborís (Bòrí) e Nahunos (cortes). Já o òbí gbànjá é apenas usado em rituais como òbí òmí, Eborís ou Nahunos, não possuindo importância como oráculo. 
O òbí ábátá se divide em ífín, quando ele é totalmente branco, oferecido à Òşáàlá e demais Òríşás fúnfún e o púpá, quando ele é rosado, ofertado à qualquer outra divindade com exceção de Şángò que abomina o uso de òbí em seus ritos, sendo substituído pelo orobo.
O òbí gbànjá pode ser fúnfún, de coloração esbranquiçada, oferecido à todas divindades exceto Şángò, ou púpá, também chamado de òbí roxo, oferecido apenas à Èşú. 
Existe também o òbí ájóòpá, òbí mais doce, vermelho e bem maior. E o òbí ífín, ofertado a Òbáàtálá, perecido com o ájóòpá porém de coloração branca. 
O kòtílé é o caroço do òbí e deve ser arrancado do mesmo após o òbí ser partido. Essa é a forma pela qual "sacrificamos" o òbí, pelo local onde ele não germinará mais. 
Após ser partido e sacrificado, o òbí deve ser sempre jogado ao chão, no solo, isso se é explicado em um ítán que conta que quando òbí veio para a terra se tornou muito popular por conseguir entrar em contato com Òdús e os Òríşás. Ele era procurado por todos e logo se envaideceu, passando a cobrar caro por suas consultas. Tal soberba acabou por incomodar Èşú, o mensageiro, aquele que transita entre o céu e a terra, que foi até a casa de òbí tirar satisfação. Òbí escutou alguém batendo em sua porta e quando abriu se assustou ao ver Èşú, caindo de costas no chão. Neste momento Èlèdúnmárè fala do òrún que por causa da vaidade e orgulho de òbí ele nunca mais falaria em pé. Quando alguém procurasse seus serviços é no chão que ele deveria ser evocado, sendo seu castigo para todo o sempre. 
O òbí é saudado por òbí ò! (Saudamos o òbí/ salve o òbí) ou òbí írè! (Òbí de sorte). 
Ele jamais é sacrificado com òbé (faca), sendo aberto com os polegares e sacrificado com as mãos. Após o Áláàfíà, o òbí pode ser cortado com faca e distribuído entre os òjúbós e os mais velhos. 
O òbí também é usado em banhos, porém nunca fervido. Tira-se o kòtílé e rala-se o òbí para depois misturar com água, pós ou sumo de ervas. 
Quando usado em determinados èbós, ele é usado inteiro, não é partido nem sacrificado. 
*Texto Mejitó Rômulo Dangballataví*

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.